Não é frequente que o rigor científico e metodológico coabite harmoniosamente com o ritmo dramático que torna uma minissérie interessante e apelativa para o grande público. Baseada em factos reais de uma investigação que se tornou conhecida pela mão da ProPublica, Unbelievable, a nova minissérie em oito episódios lançada pelo Netflix no passado dia 13 de setembro, é um exemplo paradigmático de como uma produção de grande qualidade pode conter em si mesma um valor pedagógico incalculável.
O drama inicia-se com um relato de agressão sexual a Marie Adler, uma jovem adolescente que se move num contexto social difícil, transitando entre casas de acolhimento. A forma como o seu caso é tratado é paradigmática das más práticas muitas vezes associadas aos casos de violação: os detetives responsáveis – tendo, certamente, as melhores intenções de resolver o crime –, incorreram em erros procedimentais de duplicação de testemunhos, insistência sobre a vítima que, pressionada pela estranheza dos meandros policiais, confunde a linha argumentativa, esquece ou adultera inadvertidamente pormenores do seu relato. Tal situação é vista como descredibilizadora, culminando no arquivamento do processo e na acusação formal da jovem por levantamentos de falsos testemunhos.
A fragilidade psicológica de Marie, fruto das circunstâncias difíceis da sua vivência até então, contrasta com a presença de espírito de Amber, uma estudante universitária que foi, também ela, vítima de um ataque sexual com os mesmos contornos, incluindo similitudes nos mais pequenos detalhes do modus operandi do agressor. Desta feita, o caso foi atribuído a Karen Duvall, uma personagem interpretada por Merritt Wever e representativa do rigor procedimental associado à abordagem deste tipo de vítimas.
Com notável paciência, respeito e sempre informando clara e inequivocamente a vítima sobre os passos médico-legais requeridos, a detetive Duvall consegue recolher as informações que se revelariam preciosas para o desfecho dos casos.
A Duvall junta-se a carismática detetive Grace Rasmussen. Em conjunto, e complementando opiniões e traços de personalidade, estas duas mulheres fortes juntam as peças do puzzle até chegar ao culpado.
Durante todo este tempo, porém, Marie Adler permanecera perdida: acusada publicamente de levantar falsos testemunhos de violação, é excluída dos seus círculos mais próximos, afastada do seu posto de trabalho e votada a uma injusta segregação. Só depois de encontrar um espaço seguro e alguém com quem falar de forma transparente e digna é que a jovem pôde, uma vez mais, recordar os eventos de que havia sido vítima, e ganhar confiança reforçada para regressar a tribunal e avançar com a verdade.
Unbelievable é uma história de sucesso que termina com a sensação de dever cumprido. Promove a reflexão sobre o tratamento responsável das vítimas, sem preconceitos ou julgamentos prévias.
Fica a recomendação!
You must be logged in to post a comment.