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Agustina, obrigado por teres esperado que te começasse a ler

Agustina, obrigado por teres esperado que te começasse a ler

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3 Junho, 2019 /
Frame do Documentário "Agustina Bessa-Luís - Nasci Adulta e Morrerei Criança" da produtora PANAVIDEO.

Índice do Artigo:

Fiquei bem servido. Ficámos todos.

Agustina Bessa Luís faleceu hoje aos 96 anos, vítima da doença que marcara os últimos anos da sua vida. O texto que hoje publicamos é uma carta espontânea e sentida de um habitual colaborador do Shifter em reação à notícia da sua morte. Para além do que se escrever na impresa, será sempre a obra de Agustina o melhor texto para falar sobre si, por isso, com uma obra tão vasta e original, resta-nos recomendar a sua leitura.


Foi na semana passada e até foi por causa da faculdade. Estava a pensar em estudos interartes, na relação entre Francisca de Manoel de Oliveira e o teu romance Fanny Owen — Fanny Owen é a obra de Agustina Bessa-Luís, a partir da qual Manoel de Oliveira criou o filme Francisca. Dei por mim impressionado por como fizeste de Camilo uma personagem tão camiliana. Depois dei por mim na tua prosa como numa sinfonia em crescendo.

Já se esgotaram os elogios possíveis à prosa de Agustina Bessa Luís. Num país em que os homens ainda são, tradicionalmente, os grandes escritores – serviu a tua obra de chapada de luva branca. Extensa, repleta de temas chave e de uma humanidade extraordinária, é-nos servida numa bandeja de frases bem articuladas, parágrafos musicais, diálogo louvável.

Mergulhado na tua obra, a tua partida parece ainda mais dura. Está certo que a tua idade ia avançada, mas eras um monumento vivo da literatura portuguesa. Foi com muito gosto que descobri os elogios que te fizeram, o teu doutoramento Honoris Causa — A Universidade Lusíada agraciou-a com o grau de Doutor honoris causa em 1999 e a Universidade do Porto, em 2005, em simultâneo com Eugénio de Andrade, por proposta da Faculdade de Letras — e a forma blasé com que levavas tudo isto.

Felizmente, fica a tua obra brutal, os teus livros complexos e ao mesmo tempo duros e doces. Na minha prateleira vejo Os Incuráveis, que me parece um bom alvo para depois desta Fanny Owen. Também vejo um Vale Abraão. Fiquei bem servido. Ficámos todos.

 

Autor:
3 Junho, 2019

O Alexandre Couto foi Editor do Shifter, trabalha actualmente como publicitário e colabora com diversas publicações.

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