Julho já lá vai e levou com ele o “Plastic Free July”. Este ano, a iniciativa voltou a superar as expectativas e contou com 230 milhões de participantes em todo o mundo. Então e agora? O que fica depois das fotografias bonitas de palhinhas de bamboo e tigelas de côco? Espero que um novo ponto de partida, tanto para os começam agora a pensar no tema como para aqueles que já o faziam.
Espero que a nossa consciência se sobreponha ao automatismo dos dias. Que o bem maior se sobreponha à nossa mera conveniência. Que não cedamos a tendências e comecemos por usar aquilo que temos até ao fim. Que façamos escolhas mais conscientes no momento de comprar. Que compremos menos. Que tentemos fazer nós mesmos. Que nos informemos. Que troquemos ideias. Talvez ainda seja possível salvar este lugar incrível em que vivemos. A premissa para mim é: “Não precisamos de uma mão cheia de pessoas a praticar zero desperdício de forma perfeita. Precisamos de milhões a fazê-lo de forma imperfeita”, Anne-Marie Bonneau.
Assim, voltei a desafiar-me, este ano, com a partilha de uma dica por dia no Instagram. Compilei-as para o Shifter, num artigo que pode assim servir de ajuda prática a quem quer pôr mãos à obra sobre o assunto.
Dia 1: Garrafas reutilizáveis
Tento levar a minha garrafa para todo o lado. O ano passado investi numa térmica, em aço inoxidável, e valeu cada cêntimo porque tenho sempre água fresca mesmo nos dias quentes. Qualquer garrafa de vidro que tenham em casa serve para começar – as de polpa de tomate são um bom exemplo: depois de lavadas, basta colocar a tampa ao sol para eliminar algum cheiro.
Dia 2: Café
Escolher café de verdade em vez de cápsulas à Clooney. Faço o meu numa máquina eléctrica com filtro lavável ou numa cafeteira tipo italiana. O café compro a granel n’“A Mariazinha”, uma das inúmeras casas de café que ainda existem. Ao escolhê-las estamos a impactar um negócio pequeno e a trazer para casa um produto sem plástico.
Dia 3: Leite vegetal
Consumo muito leite vegetal, o que se traduz em muitas embalagens tetra pak – não são são as piores, mas sabia que podia melhorar. Propus-me fazer leite de aveia e amêndoas. Resultado: leite pronto em 5 minutos, sem grande esforço e a uma fracção do preço. Meia chávena de aveia, dez amêndoas e água resultaram em mais de 1L de bebida guardados numa garrafa de vidro reutilizada.
Dia 4: Esfoliante de café
Este é mais um exemplo de algo que costumava comprar e passei a fazer. Aproveito as borras do café, junto-lhes azeite ou óleo de jojoba e tenho um esfoliante digno de spa. Pessoalmente gosto do cheiro a café mas podem misturar raspas de citrinos ou umas gotas de óleo essencial – se o fizerem tenham atenção à exposição solar. Depois de secarem ao sol e de guardadas num frasco, as borras do café servem também para eliminar maus odores ou fortalecer plantas.
Dia 5: Talheres e guardanapo de pano
Levar o pequeno-almoço para o caminho é parte da rotina dos dias em que saio cedo para trabalhar. Embrulho o frasco num guardanapo de pano e levo o meu kit de talheres (garfo e faca de bamboo, palhinha de inox, pauzinhos de madeira e uma colher longa feita de um tipo de plástico; tudo guardado numa capa de linho feita com excedentes). Fui chegando a este resultado aos poucos: comprando em viagem o que me fazia sentido, em vez dos kits “instagramaveis” e já feitos. Se não andarem em aeroportos com tanta frequência como eu, podem criar o vosso com os talheres de metal lá de casa e um pano de cozinha.
Dia 6: Sacos para frutas e legumes
Uma das mudanças mais fáceis foi passar de sacos de plástico para sacos de pano, para as frutas e legumes. Tenho sempre um par na mala, de vários tamanhos, porque são leves e não ocupam espaço nenhum. Não precisam comprar sacos de rede ou de algodão biológico porque é provável que já tenham em casa outros que são tão válidos. Também podem aventurar-se e fazer os vossos (com roupa velha ou restos de tecido) ou pedir a quem saiba costurar.
Dia 7: Gillette de metal
Esta é daquelas compras que, com cuidado, só precisamos fazer uma vez na vida – e substituir as gillettes descartáveis por uma de metal traduz-se em poupança para nós e para o planeta. Comprei a minha online mas existem à venda nas drogarias tradicionais.
Dia 8: Escova de bamboo + Pasta de dentes
Em viagem ou em casa uso sempre a minha escova de bamboo – uma troca que não compromete em nada a função da mesma. Este mês desafiei-me também a dar uso a uma pasta de dentes em embalagem de vidro que comprei há uns meses. Por ter carvão activado, acaba por me dar algum trabalho a limpar depois de a usar, mas o passo mais sustentável é usar primeiro aquilo que temos.
Dia 9: Copo menstrual
Comecei a utilizar o copo menstrual há um ano e meio e quem me dera tê-lo feito mais cedo. Além de ser uma alternativa ecológica é também mais saudável. Ao contrário dos tampões e pensos higiénicos, este não contem resíduos tóxicos. É muito cómodo pois pode ser usado até doze horas e dura até dez anos, o que significa uma enorme poupança monetária e de recursos. Tive a sorte de acertar à primeira com o Lunette mas recomendo às cépticas ou indecisas que passem pelo Put a Cup in It, uma plataforma muito esclarecedora sobre o uso do copo e onde podem responder a um questionário para perceber qual o mais indicado.
Dia 10: Air Floss
Pessoalmente, usar fio dentário sempre foi uma experiência horrível porque me magoava. Junta-se a isto uma boa dose de preguiça e temos a desculpa perfeita para não o fazer de todo. Foi através do meu médico que fiquei a conhecer a Air Floss – uma pequena máquina que usa um jacto de agua para produzir o mesmo efeito do fio. Apesar de já existirem opções sem plástico, o Air Floss é, para mim, a mais sustentável: dura vários anos e pode ser usada por várias pessoas porque traz cabeças substituíveis. O processo demora menos de 30 segundos e deixa uma sensação de limpeza profissional.
Dia 11: Discos desmaquilhantes
Investi num conjunto de discos de algodão orgânico que uso (na maior parte dos dias) para desmaquilhar ou aplicar o tónico. Existem várias lojas que os disponibilizam, mas também podem fazer os vossos em crochet, reutilizando toalhas de banho ou qualquer peça 100% algodão.
Dia 12: Copo de café
Beber café é imperativo quando acordo cedo. Em vez de beber um café no trabalho e contribuir com mais um copo descartável, faço o meu em casa e levo num copo de aço. Se não quiserem investir num copo, qualquer frasco com tampa cumpre o propósito. De algum modo importámos a ideia de que é “cool” passear na rua com um Starbucks na mão mas não há nada “cool” na quantidade de lixo não reciclável que isso gera e por esta altura também não há desculpas. Se saírem de casa com o vosso copo/ frasco considerem usá-lo ao longo do dia para guardar comida. As coisas têm o propósito que lhes damos e não só o que o marketing dita.
Dia 13: Escovas da loiça
Felizmente a máquina da loiça faz a maior parte do trabalho mas para o que fica de fora uso uma escova de madeira com fibras de agave. São mais higiénicas do que as esponjas tradicionais, podemos substituir apenas a cabeça e são biodegradáveis – as tradicionais nem são recicláveis. Utilizo outra de fibra de côco para lavar fruta e vegetais.
Dia 14: Cotonetes de papel
Os cotonetes são um dos artigos mais encontrados nas praias, não porque seja ritual de Verão limpar os ouvidos à beira-mar, mas porque muitas pessoas utilizam a sanita como caixote do lixo. Escolher cotonetes de papel é ter exactamente o mesmo produto mas com um material menos prejudicial ao ambiente. Mas o passo mais ecológico é deixar de os usar de todo.
Dia 15: Poder de escolha
Subestimamos o nosso poder de escolha. Num acto tão banal como pedir um gelado, podemos optar por um copo e colher (ambos não recicláveis, na maior parte dos casos), usá-los por cinco minutos e coloca-los no caixote do lixo. Com sorte, acabam num aterro onde vão contribuir para os gases de efeito de estufa; com menos sorte vão parar ao oceano. Em ambos os casos, algo que nos serviu tão pouco tempo vai durar séculos. É só um gelado, mas podem ser tantas outras coisas: palhinhas, guardanapos, sacos etc. Sermos conscientes é o passo mais importante para a mudança. É urgente repensar a nossa mera conveniência por um bem maior, tal como é urgente substituir o automatismo dos dias pelo pensamento activo. Recusar o que não precisamos é a medida com maior impacto.
Dia 16: Marmitas
Levar a nossa comida significa ter maior controle sobre aquilo que comemos mas também menos comida embalada ao longo do dia. Não tenho uma daquelas lancheiras de inox muito trendy, nem sinto que precise. Uso frascos de vidro que reutilizei, caixas de vidro e até de plástico que já tenho há algum tempo. Comecem por aquilo que têm e não desatem a comprar coisas novas só porque sim.
Dia 17: Produtos de limpeza
Os produtos de limpeza eram uma das maiores fontes de plástico em minha casa. Hoje em dia tudo o que utilizo é vinagre branco, bicarbonato de sódio, óleos essenciais, sabão de castela e água. Comecei por fazer os meus produtos de limpeza porque queria reduzir o número de toxinas em casa. Rapidamente percebi que não precisava de dez produtos diferentes para limpar cada uma das coisas e que esta solução além de eficaz era também mais barata. Há muitas receitas simples e dicas disponíveis online, como no Uma Vida sem Lixo ou na Low Tox Life.
Dia 18: Papel higiénico
Não sou fã de substituir indiscriminadamente o plástico de uso único por papel (pessoas que usam 12 sacos de papel no supermercado, estou a pensar em vocês – a transformação do papel requer muita energia: quando aceitarem esses sacos, pensem como os podem reutilizar antes de reciclar). Mas aqui trata-se do mesmo produto, na versão sem plástico. A Renova tem várias opções na linha com embalagem de papel. O 100% reciclado, sem perfume e sem cloro parece-me a opção mais interessante. Se o vosso supermercado não o disponibilizar, podem comprar online e fazer encomenda maior para compensar o impacto do transporte.
Dia 19: Panos encerados
Tal como a maioria dos plásticos de uso único, a película aderente não é reciclável. Como alternativa uso o Bee’s Wrap para cobrir recipientes, embrulhar alimentos ou levar snacks na mala. São muito leves, fáceis de lavar e, com cuidado, duram imenso tempo. Os que uso são feitos com cera de abelha mas existem opções vegan. Para os mais astutos, outra hipótese é comprar cera, juntar tecido de algodão e fazer em casa.
Dia 20: Escova corporal
A escovagem a seco é um processo de esfoliação feito apenas com uma escova. Para além de resultar numa pele mais macia, tem inúmeros benefícios associados: estimula o sistema linfático, melhora a circulação sanguínea, ajuda a tonificar, etc. É uma óptima opção para viajar porque não implica restrições de segurança nos aeroportos e é uma boa alternativa aos esfoliantes com microplástico. Comprei a minha na Body Shop, é feita de bamboo e vem sem embalagem. Estão também disponíveis em algumas drogarias tradicionais.
Dia 21: Chá solto
Chá feito a partir de folhas frescas foi a minha realidade ao crescer. Ao Domingo à noite era ritual bebermos chá feito com ervas do jardim da minha mãe e é provavelmente daqui que vem o meu amor por esta bebida. Há uns anos aprendi que a maioria dos chás em saqueta contêm micro plástico. Por isso tento evitá-los e só os consumo em situações especificas, fora de casa. Os chás que tenho em casa hoje são do jardim da minha mãe (seco as folhas ao sol e depois guardo-as num frasco) ou de viagens, ainda que neste último caso venham quase sempre embalados em plástico, por isso opto por doses maiores.
Dia 22: Ambientador
Produtos de casa eram uma das minhas principais fontes de plástico. Ao fazer os meus produtos não só evito as embalagens como os químicos tóxicos. Três ingredientes é tudo o que preciso para criar um ambientador sem tretas: água, bicarbonato de soda e um óleo essencial à escolha. Outra opção é usar água, vodka ou álcool com, no máximo, 70% de volume e óleo essencial. Misturo tudo e coloco numa garrafa de vidro com um borrifador reaproveitado de um antigo produto de limpeza.
Dia 23: Utensílios de cozinha
Vou-me repetir: comecem onde estão e usem aquilo que têm. No entanto, quando chegar o momento de substituir ou preencher uma necessidade considerem comprar utensílios feitos com materiais naturais ou duradouros. Na cozinha quase tudo o que tenho é feito de aço inoxidável, madeira, bamboo ou cortiça. Para além de serem mais bonitos do que os de plástico, duram uma vida, o que compensa o facto de serem um pouco mais caros. Felizmente, hoje em dia quase todas as lojas oferecem opções sem plástico, por isso cabe-nos escolher.
Dia 24: Compras a granel
Sou uma privilegiada por ter acesso a lojas a granel. Se este for também o vosso caso, dêem-lhes uma oportunidade. A maioria dos produtos a granel são mais baratos que os embalados e permitem que possam comprar pequenas quantidades – assim também podem testar novos sabores sem risco de desperdício. Se não tiverem acesso a estas lojas, vão ao mercado, às mercearias de rua ou aos supermercados e vejam o que podem comprar sem plástico. Quase todas as frutas e vegetais são vendidas a granel – e na padaria, no talho ou na peixaria podem pedir para colocar nas vossas embalagens.
Dia 25: Sacolas
Todos temos uns quantos sacos de pano em casa, alguns até a custo zero graças a festivais e marcas. Tenho um ou dois em cada mala e uso-os não só para o supermercado como para todo o tipo de compras: lojas de roupa, drogaria, livrarias, take-away. Sempre que posso recuso os sacos, sejam eles de que material forem. Quando não o consigo fazer, reutilizo-os sempre antes de reciclar.
Dia 26: Desodorizante
A indústria de cosmética é responsável por toneladas de resíduos plásticos mas cada vez mais surgem alternativas, sobretudo de marcas independentes. Este mês, numa passagem pela Alemanha, cruzei-me com a Bio Balsam, uma marca de desodorizantes fundada por duas mulheres alemãs. Os produtos são vegan, cruelty-free, feitos com ingredientes naturais e vêm numa embalagem de metal, perfeita para reutilizar para o meu próprio DIY. Em Portugal existem várias opções sem plástico na Maria a Granel ou na Mind the Trash.
Dia 27: Tratar da roupa
Um dos investimentos que fiz em Julho foi um Guppy Friend: um saco para colocar peças de fibras sintéticas e evitar que os seus microplásticos acabem no oceano – ou de volta ao prato de quem consome peixe e marisco. Num mundo ideal teríamos apenas roupa de fibras naturais, mas na prática é imperativo fazermos melhor com o que temos agora. A juntar a esta nova prática, já usava vinagre branco como amaciador para a roupa (não, não ficam a cheirar a vinagre) e bicarbonato de sódio para ajudar a remover nódoas. Com uma barra de sabão vegetal (como o de castela, marselha ou aleppo) podemos fazer 2,5L de sabão liquido. Para uma opção de compra mais sustentável existe a Ecox, marca portuguesa que faz detergentes a partir de óleo alimentar reciclado.
Dia 28: Roupa em segunda mão
É imperativo que compremos menos, mas quando o fizermos devemos considerar comprar em segunda mão em vez de fast-fashion. Nestes saldos, propus-me a não comprar nada novo. A indústria da moda tem um impacto brutal no planeta e na vida dos milhões de trabalhadores das suas fábricas. A maioria das peças vendidas pelas lojas de fast-fashion são feitas a partir de fibras sintéticas (poliéster é a mais comum e deriva do petróleo). Por isso, comprar em segunda mão significa diminuir a procura e a produção. Significa também dar uso a peças que já existem e que usaram inúmeros recursos para serem produzidas. As peças de ganga são um exemplo: envelhecem bem e podemos evitar que se gastem mais de 7 mil litros de água para produzir apenas umas calças.
Dia 29: Comida congelada
Para podermos reduzir o nosso lixo é essencial perceber de onde é que ele vem. A comida costumava ser a minha maior fonte de plástico. Parte do problema foi resolvido com compras a granel e frescos, mas como estou muito tempo fora continuava a comprar imensos vegetais congelados para garantir que tinha sempre algo com que cozinhar. Este mês passei a fazer minha própria mistura de wok a partir de vegetais frescos; e continuei a congelar fruta para fazer smoothies. Outro truque que utilizo é congelar ervas aromáticas e utilizá-las como se fossem frescas.
Dia 30: Sabonetes
A oferta de produtos sólidos cobre quase todas as áreas das versões líquidas: shampô, condicionadores, hidratantes, perfume e por aí vai. Na maioria dos casos isto significa pouca ou nenhuma embalagem. Pessoalmente, tenho um cabelo complicado e pele acneica por isso optei por manter a minha rotina aí. Ainda assim encontrei uma coisa que podia mudar: adeus gel de banho, olá sabonete natural. Escolhi uma barra da 2 em 1, feita com ingredientes hidratantes e que inclui uma lufa – uma esponja 100% natural. Quase todas as embalagens de produtos de higiene são feitas de HPDE (High Density Polyethylene) listado como frequentemente reciclado. Mas muitas não o são e vão viver para lá dos nossos bisnetos. Não é por um material ser reciclável que temos carta branca: há que repensar e reduzir.
Dia 31: Iogurtes caseiros
Terminei o mês com uma nova conquista: iogurtes vegetais caseiros, graças à minha nova Yogurtnest, que adquiri em segunda mão. É feita com matérias primas portuguesas e naturais e não requer electricidade. Para quem gosta de cozinhar, há algo de gratificante em fazermos a nossa comida de raiz – e é especialmente feliz se conseguirmos reduzir o plástico neste processo. Isto é válido para qualquer produto que comprem embalado: bolachas, bolos, sumos – tentem fazê-los em casa. Há milhares de receitas simples que são à prova de desastres na cozinha.
Texto de Telma Rodrigues
Assistente de bordo de profissão, a Telma é também viajante nas horas vagas. Especialista em coisa nenhuma mas curiosa sobre tudo o que a rodeia, desenvolveu particular interesse pelos temas que envolvem sustentabilidade e impacto ambiental.
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