Derrota do partido de Erdogan antecipa mudança histórica na Turquia

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Foto de Imamoglu via Twitter

Derrota do partido de Erdogan antecipa mudança histórica na Turquia

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Apesar dos ventos de mudança que se fizeram sentir, o calendário eleitoral turco espelha as dificuldades que a oposição sentirá nos próximos anos.

Depois de em Março deste ano o partido do Presidente turco, Recep Tayyip Erdoğan, o AKP, ter perdido por uma pequena margem as eleições municipais na principal cidade do país, Istambul, um dos seus porta-voz apressou-se a vir a público denunciar irregularidades no sufrágio. Denunciavam influências ilegais e uma má contagem dos votos que davam, pela primeira vez em 25 anos, a presidência da cidade ao principal partido da oposição. Face às denúncias feitas pelo partido no Governo, o Alto-Comité Eleitoral da Turquia (YSK) anunciara meses mais tarde, numa decisão criticada pela oposição, a repetição da eleição agendada para 23 de Junho.

No dia 23 de Junho as eleições repetiram-se e o que se repetiu também foi a derrota do Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) de Erdogan, desta feita por uma margem maior, reveladora da vontade de mudança da população da cidade de Istambul, onde vivem perto de 15 milhões de pessoas. Binali Yildirim, último primeiro ministro do país, foi o candidato do AKP às eleições que vê agora Ekrem Imamoglu, do Partido Republicano do Povo (CHP), assumir a liderança da cidade.

Apesar de ser apenas a derrota numa cidade, os resultados desta eleição estão a ser vistos como potencialmente históricos. Por um lado, seguem a linha de algumas das principais cidades turcas, como Ankara, onde o AKP também tinha perdido as eleições. Depois porque, como o próprio Erdogan disse em tempos, segundo a tradição política turca “quem ganha Istambul, ganha a Turquia”, podendo este resultado antecipar a sua perda de poder.

Erdogan está à frente dos destinos da Turquia desde 2003, tendo já ocupado o cargo de Primeiro Ministro e agora de Presidente; a sua liderança tem sido altamente polémica e criticada pelas sucessivas repressões à liberdade democrática, de expressão e de imprensa — recorde-se, por exemplo, que foi pelas mãos de Erdogan que o Twitter deixou de funcionar na Turquia em 2014 ou que em 2017, Taner Kiliç, Presidente da Amnistia Internacional na Turquia, foi preso por alegadas ligações a Fethullah Gülen, académico turco que Erdogan acusa de ter desencadeado a tentativa de golpe de estado no país. Para além disso, o partido de Erdogan controla os principais canais públicos de informação.

Na ressaca da vitória, Ekrem Imamoglu, já se fez ouvir, sublinhando a importância da mudança de rumo em Istambul. Para o agora eleito presidente de Istambul, a vitória nestas eleições representa uma nova página na história da Democracia turca. Imamoglu disse mesmo que foram os votantes no seu partido que arranjaram uma democracia estragada, dando lugar a um novo começo. Istambul é uma cidade importante pela concentração de pessoas e serviços que a tornam num epicentro político e económico, essencial à manutenção do poder sobre as elites do país.

Apesar dos ventos de mudança que se fizeram sentir, o calendário eleitoral turco espelha as dificuldades que a oposição sentirá nos próximos anos. As últimas eleições gerais na Turquia decorreram em Junho de 2018 e ficaram marcadas, por um lado, pela concretização da mudança constitucional proposta pelo partido de Erdogan e anteriormente votada, de um regime parlamentar para um regime presidencialista, dissolvendo o gabinete de Primeiro-Ministro; e, por outro, pela perda da maioria na Assembleia Nacional, o que obrigou o AKP a estabelecer coligações com os nacionalistas. As próximas eleições gerais estão marcadas para 2023 e, adivinha-se, um terreno eleitoral mais dividido na aproximação às urnas.

Com a derrota em Istambul, toda a polémica em torno da recontagem das eleições, e a contestação de que Erdogan tem vindo a ser alvo nos últimos tempos, antecipam-se anos politicamente activos na definição do futuro da Turquia. Erdogan, de resto, já utilizou o seu Twitter para reconhecer o resultado das eleições e desejar que sejam o melhor para o povo, enquanto que, Imamoglu, por seu turno, mostrou a vontade de convergência e harmonia na condução do cargo.

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  • João Gabriel Ribeiro

    O João Gabriel Ribeiro é Co-Fundador e Director do Shifter. Assume-se como auto-didacta obsessivo e procura as raízes de outros temas de interesse como design, tecnologia e novos media.

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