Uma teoria que fez ondas no final do século passado. A definição mais simples para pensamento lateral é pensamento criativo, mas como hoje em dia já tudo é “criativo”, vamos ser um pouco mais específicos. O pensamento lateral procura ser insistente e construtivo, com o objectivo de gerar soluções. Ao contrário do pensamento normal ou vertical, não está interessado apenas no facto de uma ideia ser boa ou não.
Com esta definição estabelecida, como é que se ultrapassa um pensamento lógico e gradual, preocupado com o seu próprio sentido? Para simplificar, podemos dizer que o pensamento lateral não se preocupa assim tanto com a certeza de cada passo para chegar ao sítio certo. Como Edward De Bono explica no seu livro acerca de pensamento lateral, temos de estar dispostos a seguir por aqui e por ali, trocando a profundidade do pensamento vertical por um pensamento que ocupa áreas diferentes das nossas ideias – tornando-as, de certa forma, laterais.
Para que é que o pensamento lateral serve?
Esta pergunta é a mais fácil. Serve para gerar novas ideias, para resolver problemas e para aperfeiçoar e analisar ideias. Também garante que não haja polarização de um determinado tipo de ideia.
Aviso de grande importância: a suspensão do julgamento suspenso deve ser um pré-requisito do pensamento progressivo. É preciso suspender a crítica de ideias e conceitos num processo como este. Toda a gente tem direito a estar errado porque daí também nascem grandes pensamentos.
É importante dizer sempre o que pensamos quando procuramos um pensamento progressivo e lateral. Deve expressar-se tudo o que acreditamos fazer sentido, sem vergonha ou remorso. Até quando estamos a sugerir algo que possa não fazer sentido de forma directa, estamos a encontrar informação fora dos padrões estabelecidos. Ajuda imenso ter toda a informação que precisamos para conseguirmos suceder na prática do pensamento lateral.
A máxima é: por favor, não mandem logo as ideias abaixo, por muito estúpidas ou complicadas que sejam. A fruta não nasce madura.
Que técnicas podemos usar?
#1 – criação de novos pensamentos
Como acredito que todos os criativos saibam, o princípio de ter boas ideias é através da sugestão de pensamentos alternativos. A forma mais fácil de o fazer é através da sugestão de novos ângulos de análise. Mais do que procurar a melhor solução, devemos procurar o máximo de soluções possíveis. O objectivo deste exercício é abalar a rigidez dos nossos padrões de pensamento, criando novos tipos de ideias e caminhos por onde seguir.
Apesar de ser difícil uma ideia apresentar-se construída com todo o detalhe através desta técnica, permite-nos chegar a novos pontos de partida, fins interessantes, detalhes que compõe as próprias ideias. Se a tua ideia for boa, as pessoas vão querer contribuir para ela. As boas ideias têm o poder de se expandirem. A sua forma inicial é isso mesmo, só inicial.
Perdoem-me o exemplo publicitário (sacado do Hey Whipple), mas um whisky pode ser vendido através da sua idade (tão velho como o seu legado), do seu sabor (o verdadeiro sabor da Escócia), ou até pela sua cor (o tom âmbar de um destilado perfeito).
#2 – dar uma tareia ao Status Quo
Às vezes é obrigatório desafiar o status quo. A dica aqui não é só atacar os ângulos, mas atacar as próprias ideias. Afinal, as ideias podem ser questionadas e é sabido que se lhes dermos luta, podemos fazê-las viver autênticas metamorfoses. É uma questão de ir para além da criação de alternativas, mas sim encontrarmos alternativas dentro das próprias ideias. Esta técnica reforça uma das máximas do pensamento lateral: não há caminhos errados.
Querem saber um truque? A técnica do porquê ajuda neste exercício para desafiar os pontos de vista onde chegamos. É uma forma de focar e orientar as ideias. A forma de a pôr em prática é simples. Mais uma vez peço desculpa pelo exemplo publicitário: Vamos criar uma camisola de futebol só com logótipos de marcas. Porquê? Porque o futebol tem uma presença de patrocinadores cada vez maior.
O uso do porquê serve para exigir informação concreta, logo, está a testar o caminho. Pode ser direccionado para diversos aspectos do assunto. Ainda assim, a melhor parte desta pergunta “porquê” é mesmo criar desconforto e novos caminhos através das explicações que obtemos. Olhar para qualquer tema de forma diferente aumenta as possibilidades de aplicarmos a disrupção ao que estamos a analisar. Também nos confirma como curiosidade genuína é meio caminho andado para boas ideias.
#3 – ganhar o hábito de apontar à lua
As duas técnicas que falámos relacionam-se com dois aspectos fundamentais do pensamento lateral. No entanto, estas técnicas ainda se parecem com a nossa forma de pensar no pensamento dito vertical. A forma de o evitar é através de procurarmos a inovação em cada uma das nossas ideias, assim estamos a analisar novos conhecimentos e novas formas de análise. Implica pensar de forma progressiva no terreno das ideias e das soluções.
Numa era que o Google está a impingir-nos um pensamento moonshot (apontar sempre à lua em cada projecto) em cada prática criativa, o pensamento lateral ganha contornos de contemporaneidade. Podemos deixar o pensamento critico a identificar e explicar um efeito, o pensamento lateral preocupa-se com a criação do próprio efeito. Algo que não exista, estão a ver? Isso é o ideal, deixar as pessoas boquiabertas acerca da profundidade de um pensamento.
#4 – a fugir das ideias dominantes
De acordo com Edward De Bono, toda a gente está confiante que sabe o que está a ser falado e lido, mas quando se tenta extrair a ideia dominante, há muita dificuldade em fazê-lo. É difícil converter uma noção vaga do assunto a ser tratado numa ideia concreta e coerente. É necessário converter esta vaga noção numa forma de pensar que nos pode permite alcançar ideias paralelas.
Um dos maiores propósitos de pegar numa ideia dominante é ser capaz de escapar dela. A fuga de padrões estabelecidos é metade do caminho até à criação de novas ideias e uma das formas mais concretas de aplicar o pensamento lateral. Em publicidade, chamamos convenções de mercado às práticas repetitivas que um determinado tipo de produtos costuma ter nos seus anúncios (gostas de água num copo de imperial, por exemplo). Do meu próprio entendimento depois de ler este livro, acredito que todos os indivíduos têm perspectivas diferentes e que a ideia dominante que encontram é diferente consoante a nossa identidade.
#5 – termos noção dos Pontos de Partida e das Áreas de Atenção
Esta técnica está relacionada com as anteriores, porque também está relacionada com a perspectiva. A nossa Área de Atenção é a parte do problema sobre a qual nos estamos a debruçar, o Ponto de Partida é o sítio onde começamos a analisar o problema. A escolha deste ponto de partida é importante porque a nossa forma de olhar para as ideias pode mudar a ideia em si. Isto acontece porque as ideias andam encarriladas e o sítio de onde partem tem uma grande importância.
A Área de Atenção começa pequena, mas às vezes consegue englobar todo o assunto. É essencial percebermos que detalhes estamos a preterir ou a deixar para trás. Às vezes percebermos o que nos está a falar pode despoletar um novo caminho de ideias. Nada é trivial demais para despoletar uma ideia. A dificuldade em cada situação é encontrar é casar a perspectiva com a essência do problema.
Um bom exemplo disso é o caso em que o Dr. Watson despacha o cão enorme como sendo de não importância para a historia, mas Sherlock lhe diz que o cão não ser importante para a história é a prova viva de que alguém soube contornar o cão. A atenção que deu ao cão é um bom exemplo de pensamento lateral. Isto casa muito bem com o fracionamento de um problema.
#6 – dividir para conquistar
Esta técnica é muito semelhante à analise. Parte da desconstrução de uma situação em pequenos componentes. Amigos académicos vão reconhecer as vibes de Jaques Derrida se estiverem nessa onda. Ainda assim, o pensamento lateral usa o fracionamento para encontrar material que estimule a reestruturação da situação original.
#7 – vira tudo do avesso
No método da reversão, partimos da forma de estar de uma situação e viramo-la do avesso, de trás para a frente, de dentro para fora, por aí em diante. A cada passo, vemos o que acontece e apontamos. É uma forma provocadora de rearranjar a informação. Deve ter sido assim que se chegou aos carros que andam sozinhos.
Há muitas formas de reverter situações: o cigarro fuma a pessoa, os cigarros são soprados em vez de puxados, o fumo é música, cada trago tem um sabor diferente. O exemplo de Edward De Bono também é engraçado: se um carro parou para não atropelar as ovelhas, as ovelhas puderam ir à volta do carro.
#8 – lança tudo para a mesa
As técnicas que corremos caminham quase todas para aqui. A estimulação aleatória, por muito mal que soe, parte do princípio que uma ideia deve ser desenvolvida num processo aberto em que a informação a transforma numa ideia nova. Cheia de inovação, claro. É possível criar estímulos externos deliberados para actuarem sobre uma ideia por aí fora
Apesar de Edward de Bono lhes dar nomes chatos como “Exposição” e “Criação de Alternativas Formal”, estas técnicas são muito simples. Exposição é quando nos pomos numa posição em que somos sujeitos a estímulos, por exemplo:
- aceitar inputs aleatórios;
- exposição de ideias em brainstorming;
- exposição a ideias de outros campos;
- exposição física a estímulos, ir a um espectáculo, museu, exposição.
O objectivo é olhar para tudo de forma orgânica, evitando uma postura em que estamos a forçar o aparecimento de ideias.
A “Criação de Alternativas Formais” é quando pegamos numa palavra para criar discussão, depois vamos para um livro ou revista. Em terceiro lugar, escolhemos mais um objeto para contrapor. O objectivo é a mente faz ligações que nem entendemos.
Uma espécie de conclusão
Podem parecer uma série de viagens na maionese, mas estas técnicas servem de auxilio em momentos em que ninguém tem ideias. A verdade é que não são fáceis de aplicar e não evitam que o processo de criação seja mais agradável, mas pode ajudar-nos a chegar a resultados com muito mais eficácia. A forma como as utilizamos torna-se orgânica e natural em muito pouco tempo – algumas delas já aplicávamos e nem sabíamos os seus termos técnicos ou procedimentos formais. Esta é a altura em que desejo boas ideias a todos e espero que este guia tenha servido de ajuda, mas para ser verdadeiramente lateral, despeço-me com saudações cósmicas, à prova de pensamentos chatos e verticais.
Bibliografia:
- Lateral Thinking, de Edward De Bono
- Hey Whipple Sequeeze This, de Luke Sullivan
- A Technique for Producing Ideas, James Webb Young
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