“Não tenhas pressa mano, curte a adolescência, vão ser os melhores anos da tua existência”, já dizia Valete… E o Sumol Summer Fest é um fiel retrato desse mesmo state of mind. Uma geração, ou parte significativa da mesma, continua “insane in the brain”, comemorando a entrada de mais um verão, enquanto inicia a temporada de festivais ao som de algumas das rimas e batidas mais contagiantes do panorama nacional e internacional. O conceito de Hip Hop Summer Fest invadiu por completo os cartazes festivaleiros deste ano, e a expectativa continua em altas, quando ainda faltam aterrar no nosso país nomes como Travis Scott, Anderson .Paak, Oddisse, Lil Pump ou Desiigner. Mas o futuro a seu tempo, por agora ficamos pela retrospectiva de duas noites históricas.
6 de julho — Wet Bed Gang/ Portugal vs Brasil/ French Montana
Pouca passava das 21 horas, quando Gson, Zara G, Kroa e Zizzy entraram em palco, acelerando ou até mesmo terminando com o jantar mais tardio de alguns dos campistas, que rapidamente se moveram para o recinto numa espécie de avalanche. Acompanhados pela sua banda, com Simão Chaves na bateria, Ricardo Malveiro no baixo e Rui Terruta na guitarra, foi, como habitualmente, Conductor o DJ responsável por orquestrar, durante cerca de 1 hora de êxtase absoluto, os rapazes de Vialonga e a multidão ansiosa por vislumbrar e acompanhar vocalmente os seus ídolos nos seus maiores êxitos. “Aleluia”, “Não sinto” ou “Chaminé” elevaram o público a níveis de adrenalina avassaladores e para tornar a drena mais pesada ainda, Deejay Telio e Giovanni juntaram-se à festa nas faixas “Almoçarada” e “50/50”.
Apesar das férias já terem iniciado para a maioria da comunidade estudantil, estes não deixaram de fazer os trabalhos de casa, levando as letras na ponta da língua, sem auxiliares de memória e com muito poucas faltas de atraso – algo muito comum na maioria dos concertos a que assistimos. Prova de bom trabalho da promotora do festival, atenta aos “ídolos” das novas gerações mas principalmente do Hip Hop que conquistou o seu espaço como sonoridade mainstream, com tudo o que isso acarreta de muito bom e de menos positivo… mas isso é conversa para os puristas. Afinal isto não vai parar “enquanto houver vibe”.
Salve rapaziada! Após o concerto dos Wet Bed Gang, foi momento para um Clash na Lusofonia, numa autêntica ode à língua portuguesa. Com DJ BIG, Sir Scratch, Gson, Papillon e Holly Hood a representarem a seleção Portuguesa, em dia de derrota brasileira no mundial de futebol, a tarefa de jogar fora ficou a cargo de DJ Nyack, Rincon Sapiência, Rashid, Drik Barbosa e Kamau.
Um dos estandartes da organização para a edição do Sumol Summer Fest 2018, abriu com 20 minutos do melhor que se produz em território nacional. E a primeira música foi logo com uma faixa nova de Sir Sractch, “Repara”, seguindo-se Gson com “Voar”, Papillon com “Metamorfose Fase II”, Holly hood com “Cobras e Ratazanas”, e ainda Plutónio, convidado surpresa da equipa das quinas. DJ BIG mostrou que sabia bem ao que vinha e tratou de trazer “duplates de tudo”. Desde “Escáfia” de Nasty Factor, a “Viver para Sempre” de Carlão, ou até mesmo Xutos e Pontapés com direito a props do old g Tim.
A equipa portuguesa, ciente da vantagem de jogar em casa, soube dropar alguns hits do Hip Hop nacional para colocar os brasileiros em sentido e o publico português em êxtase — “Poetas de Karaoke” do Sam The Kid, “Re-tratamento” dos Da Weasel, “Mo boy” do Dillaz, ou “Vida Boa” do Slow J, foram alguns dos temas que receberam maior feedback por parte da plateia. Porém, apesar da hipotética vantagem portuguesa, pela actuação de cariz quase individual e pouca interação entre os “jogadores” face à entrega dos brasileiros em conjunto com um enorme trabalho de “equipe” e um DJ fora do comum, a existir um vencedor seria o nosso povo irmão. O cypher final com todos os presentes foi a cereja no topo do bolo, até porque no final de contas aqui o que interessava mesmo era participar.
Em relação a French Montana não vale a pena gastar muitos caracteres porque estávamos à espera de um concerto. Fica a dica que como host até podia ter sido boa aquisição para encerrar o primeiro dia de festival. Ao seu dispôr tinha a maior plateia da noite e, no seu repertório musical uma série de hits, além de 2 álbuns e mais de 20 mixtapes prontos a estrear em território português… Contudo se vivêssemos alienados do mundo pop, teria sido possível sair dali a imaginar que, por exemplo, “Gucci Gang” era da autoria de Montana, tal a quantidade de músicas de outros artistas a que recorreu durante a sua actuação em formato discoteca (num festival).
7 de julho — Piruka/ Vic Mensa/ Joey Bada$$
Será Piruka o rapper que fez “da tuga a América?” Não sei, mas certo é que foi o rapper da Madorna o escolhido para abrir uma noite de Hip Hop maioritariamente americano e de qualidade acima da média.
Piruka é um autentico fenómeno nacional, e não é só na internet e no mundo das visualizações. Na realidade também é, e nem o beef com 9Miller e Holly Hood abalou a confiança do rapper e dos ouvintes festivaleiros, que apesar de terem os seus favoritos, quando chega o momento da verdade sabem as letras de ambos e fazem a festa ao som de qualquer um. Acompanhado por Savage, Timor, Vate MC e DJ NelAssassin obrigou o recinto a encher mais cedo que no dia anterior e cumpriu as expectativas dos presentes. Durante o concerto houve tempo ainda para uma importante homenagem ao Puto G, que faleceu no passado dia 30 de junho, protagonizada pelo rapper Timor.
Seguiu-se Vic Mensa e uma dose de boa loucura do rapper que mais conversou com a plateia neste Summer Fest. Um verdadeiro maluco beleza, como diria Rui Unas. Se num momento está a saltar das grades do palco para a plateia, noutro está a discursar acerca do movimento de refugiados que chega a Europa e a violência policial nos Estados Unidos. Os temas “We could be free” e “16 shots” foram mote para duas fortes mensagens que marcaram a actuação do rapper de Chicago.
“Esta merda é que é boa” foi quase tão viral como o clássico “Oh Elsa” em ambiente festivaleiro. O impacto foi tal que durante um momento de silêncio no concerto o próprio Vic Mensa, sem fazer ideia do que significava a expressão, improvisou por cima uma versão de “Seven Nation Army” dos White Stripes. Sinal de quem não veio cá apenas para cumprir calendário e faz questão de personalizar o espectáculo de acordo com o publico e ambiente em que se encontra. Nem a falha de som abalou o concerto que teve em “Are you Mad” o momento mais apoteótico.
What’s my name? What’s my name? Joey Fuck!”#$ Bada$$
“O melhor fica para o fim.” Expressão cansada mas válida quando sentimos a presença de Joey Bada$$ no palco do Sumol Summer Fest. Um dos pilares do movimento Beast Coast é também das vozes mais entusiasmantes do Hip Hop americano.
Uma espécie de “8 ao 80” em comparação com a actuação de French Montana. Bada$$ é tipo de artista capaz de quebrar as barreiras das gerações e unir diversos tipos de ouvintes em torno da sua sonoridade e mensagem. Com particular foco no seu último álbum, All-American Bada$$, lançado o ano passado, recuperou também alguns dos seus maiores êxitos, como “Paper Trail$”, “Christ Conscious” ou “Survival Tactics” para alegria e nostalgia dos ouvintes mais antigos.
Se o concerto de Montana pecou pelo excesso de músicas de outros artistas, durante a actuação de Bada$$ nem espaço houve para a parte de A$ap Berg na faixa “Pull up” ou Capital Steez em “Survival Tactics”. A homenagem a XXXTENTACION foi a única semelhança entre os dois cabeças de cartaz do festival, com Joey Bada$$ e French Montana a prestarem mais ultimo adeus a uma voz tão conhecida da geração presente no festival, algo bem visível ao primeiro bass da faixa “Look at me”.
Após 2 noites de hip hop ao mais alto nível e poucas desilusões, o balanço da edição de 2018 do Sumol Summer Fest é positivo e o grande vencedor é novamente o Hip Hop, que continua a dominar grande parte dos festivais nacionais. Cabe às novas gerações de ouvintes, no meio de tanta escolha, encontrar o equilíbrio perfeito entre o trash talk, a vibe e a mensagem. Porque tudo faz parte, e tudo faz falta.
Fotografia: Marco Brandão
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