A Morte de Raquel é a mais recente criação da encenadora, dramaturga e actriz Raquel Castro, e é uma co-produção Barba Azul, São Luiz Teatro Municipal e Teatro Nacional São João.
Depois do monólogo Turma de 95, em que sozinha nos guiava por um regresso aos tempos de ciclo revivendo as suas experiências com a ajuda da memória de antigos colegas de escola, desta vez, Raquel conta com a ajuda dos actores Joana Bárcia, Nuno Nunes e Rita Morais para nos contar a história da sua vida, que deambula entre a realidade e a ficção.
Quem nada souber de antemão sobre o espetáculo poderá estranhar a oferta de lenços à entrada da sala, mas logo perceberá o que o espera pelo adereço que ocupa a posição central de destaque do palco. Um caixão que representa a parte física de quem nos falará de outro tempo instintivamente denuncia que estamos num funeral, mas analisando as suas cores e padrões decorativos percebemos que este não será um funeral convencional, mas uma completa celebração da paixão pela vida.
Ao longo de mais de hora e meia ouvimos os actores a dirigir a cerimónia, transmitindo as palavras que a defunta lhes deixou ao longo dos anos durante os quais preparou este seu último acto. Palavras que revelam uma reflexão profunda sobre a morte, a reconhecida vencedora de um jogo cujo objectivo é dela escapar, mas que nunca se deixa capturar pela soturnidade do tema e prefere vaguear pelos diversos pormenores que tornam a vida a mais bela manifestação artística: a cada pessoa que conhecemos, cada conselho que demos, cada momento que lidamos com uma perda, tudo experiências que no fim do jogo terminado nos fazem ter influência, não no resultado, mas no desenvolvimento de jogos futuros.
E no discurso, por vezes pontuado por canções simples e sinceras, discernimos uma preocupação em retratar uma pessoa de todas as cores possíveis. Somos confrontados com os sucessos, os insucessos, as dores amargurantes e as felicidades extasiantes, o que os outros pensam de nós e o que nós pensamos dos outros antes e depois de os conhecer, as indecisões ponderadas e as decisões espontâneas que acabam por levar ao mesmo destino. Temos a oportunidade de assistir a um relembrar de Raquel mulher, Raquel teatro, Raquel filha, Raquel amiga, Raquel mãe e Raquel namorada. Partes que podem ou não ter-se conhecido ao longo de uma vida, por vezes conflituosas, agarradas às necessidades umas das outras, mas que acabaram por contribuir de igual forma para a imagem total do que há para celebrar no fim da vida.
Ao convidar-nos para revisitar os seus tempos de ensino básico e partilhar a celebração da sua vida aquando do seu fim, assistimos a uma hiperpessoalização da criação desta artista, que funciona magistralmente para nos envolver nestas histórias onde todos nos conseguimos projectar, emocionar e viver. É caso para dizer que Raquel Castro vive e está de boa saúde.
A Morte de Raquel está em cena na Sala Mário Viegas do Teatro Municipal São Luiz até 15 de Março.
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