Se costumas estar atento à imprensa internacional deste conta de que, de repente, Edward Snowden regressou à agenda mediática. Foi entrevista à WIRED, foi uma entrevista maior ao The Guardian; foi texto publicado pelo próprio no francês Le Monde; foi notícia escrita em espanhol no alemão DW. E no New York Times (NYT) também houve um destaque. Snowden “está de volta”, apesar de nunca ter parado de tweetar, com um livro de memórias – um registo na primeira pessoa, sobre si, que o whistleblower pretende que perdure.
Snowden dispensa apresentações: trabalhou na NSA, sigla que significa National Security Agency – a agência de segurança dos EUA. Lá dentro contactou com um sofisticado sistema de vigilância massiva e decidiu contar tudo ao mundo. De repente todos nós – o mundo inteiro – ficámos a conhecer um lado secreto dos EUA e, essencialmente, como um grande governo pode exercer vigilância massiva em relação aos seus cidadãos e aos cidadãos dos ‘outros’, usando as ferramentas que o progresso tecnológico lhe deu.
A história de Snowden e das suas revelações já todos conhecemos – ou deveríamos conhece. Laura Poitras fez um documentário sobre isso, o jornalista Luke Harding escreveu um livro, e Oliver Stone realizou um filme baseado nesse livro, procurando traçar um perfil da figura que entretanto os EUA consideraram inimiga.
Mas se o livro de Harding ou o filme de Stone são isso mesmo: um trabalho deles, um perfil feito a partir do que se conhece de Snowden e do que Snowden eventualmente lhes contou. Vigilância Massiva, Registo Permanente, publicado no passado dia 17 de Setembro, é Snowden na primeira pessoa. “(…) A decisão de avançar com provas as malfeitorias do governo foi mais fácil para mim do que a de fazer, aqui, um relato da minha vida”, escreve o whistleblower no prefácio. “(…) Tomei a resolução de nunca divulgar quaisquer pormenores da minha vida pessoal que pudessem causar mais perturbação aos meus familiares e amigos, que já estavam a sofrer o suficiente pelos meus princípios. Estava tão preocupado com a ideia de poder aumentar esse sofrimento que hesitei em escrever este livro.”
O que Snowden grava em Vigilância Massiva, Registo Permanente ainda não conhecemos ao pormenor, até porque não lemos o livro, mas a linha do tempo por que este guia é aquela que se esperaria. Segundo a do NYT, o livro fala sobre Snowden, sobre como chegou à NSA, como foi parar ao quarto de hotel em Hong Kong com Greenwald, sobre ter rejeitado uma proposta de Julian Assange para libertar os documentos através da WikiLeaks e sobre a sua vida exilado em Moscovo — um dos capítulos em que porventura revela mais. “A razão por que está a ler este livro é eu ter feito uma coisa muito perigosa para alguém na minha posição: decidi dizer a verdade”, lê-se também no prefácio de Snowden. “Este livro é a respeito do que levou a essa decisão, dos princípios éticos e morais que a enformaram, e de como nasceram… o que significa que também é sobre a minha vida.”
Vigilância Massiva, Registo Permanente está à venda em vários países, incluindo Portugal, com versão traduzida. Entretanto, o Departamento de Justiça norte-americano instaurou o processo civil contra Edward Snowden pela publicação das suas memórias; em causa, está a publicação do livro sem ter sido visto previamente pela CIA e pela NSA, como é requerido a qualquer ex-funcionário das agências de inteligência norte-americanas. Permanent Record (título original) é neste momento o livro mais vendido a nível mundial.
Yesterday, the government sued the publisher of #PermanentRecord for—not kidding—printing it without giving the CIA and NSA a change to erase details of their classified crimes from the manuscript. Today, it is the best-selling book in the world: https://t.co/oMJLOvUjG7
— Edward Snowden (@Snowden) September 18, 2019