Ouvimos todos os dias e em todo o lado falar sobre Inteligência Artificial. É uma das disciplinas de ponta das sociedades contemporâneas, mas nem por isso um conceito completamente familiar à maioria das pessoas – pelo menos tanto quanto devia. Como explorámos no ensaio “Uma Questão de Inteligência”, o termo Inteligência Artificial é tão significativo quanto o entendimento do leitor da área em questão e, para que socialmente saibamos do que estamos a falar é preciso que desenvolver a literacia nesta matéria.
Quando comecei a escrever o texto que segue nestas páginas, a ideia era de forma sucinta reflectir sobre o uso da expressão ‘inteligência artificial’ na redação dos artigos do Shifter, tentando estabelecer uma política editorial que evitasse o abuso desta expressão. Contudo, depressa esse desafio se revelou maior do que o previsto e a reflexão se espraiou pela diversidade de perspectivas e referências. Assim o texto foi assumindo uma forma mais longa do que previsto, e tornou-se numa espécie de ensaio que procura situar-nos nesta interessante questão. Através de uma contextualização do momento em que vivemos, e da revisão de alguns dos argumentos e ideias que pontuam este tópico desde a sua origem, procuro exprimir e sublinhar a importância deste debate. Um debate não só sobre a tecnologia mas sobre as palavras e o seu efeito na nossa compreensão do que nos rodeia. – prólogo de Uma questão de inteligência.
Inteligência Artificial é um conceito que parte de uma abstração da capacidade das máquinas de produzirem resultados que partem de processos cognitivos, mas, nem por isso pressupõe uma essência divina dos sistemas tecnológicos que os torne numa espécie de humanos. Isto é, tal como outras áreas de saber e fazer, a Inteligência Artificial com que hoje convivemos é o resultado do esforço de centenas de pessoas de diversas áreas, como investigadores e programadores, e, portanto, uma área para que é preciso olhar com mais consciência crítica do que fé. Se é certo que o termo e a área são um sinal de sucesso nas ciências, é preciso não desprezar o reverso da medalha que tantas e tantas vezes tem sido trazido para cima da mesa.
As consequências éticas da Inteligência Artificial, a perpetuação de estereótipos e preconceito sobre a forma de sistemas programados, ou o custo energético associado ao treino destes sistemas são algumas das questões que se levantam quando nos debruçamos sobre a área e, todas elas, merecem uma discussão pública informada. Para isso é preciso que haja troca de informação entre as diversas áreas e incentivos à compreensão destes sistemas extremamente complexos. Foi com isto em mente que a Universidade de Helsínquia e a Reaktor criaram Elements of A.I..
Como se pode ler no site do programa de aprendizagem, agora traduzido para português, a ideia surgiu em 2018 com o intuito de empoderar os cidadãos com conhecimentos sobre inteligência artificial antes que estes se sentissem ameaçados por esta nova tecnologia. Assim, ao disponibilizar um curso inteiramente gratuito os finlandeses criaram a oportunidade para de forma simples, gratuita e acessível, mais pessoas se pudessem introduzir à área e aprender o básico.
Entretanto, e como parte da estratégia do Governo finlandês aquando da sua presidência do Conselho da União Europeia, o objectivo do curso alargou-se e o âmbito demográfico também, passando-se a assumir a meta do 1% da população europeia como mínimo desejável. Para isso foram feitos esforços de tradução do curso para as diversas línguas faladas no espaço da União Europeia. Em 2018 foi lançado em inglês, em 2019 na Suécia, Estónia, Alemanha e Noruega, em 2020 na Letónia, Lituânia, França, Bélgica, entre outros, e, finalmente, em 2021, e pelas mãos da NOVA SBE, o curso chega agora a Portugal. Esta chegada dá-se numa altura em que já mais de 600 mil pessoas provenientes de mais de 170 países se registaram no curso, e dá uma oportunidade a todos os portugueses de explorar os conceitos básicos da I.A, e conta com a colaboração da Comissão Europeia na tradução dos conteúdos.
Elements of A.I. divide-se originalmente em dois cursos, “Introdução à I.A.” e “Construção de uma I.A.”, mas na versão portuguesa existe, pelo menos por agora, apenas uma opção. O curso de Introdução à I.A. em português está por sua vez subdividido em 6 capítulos que abordam alguns dos tópicos mais interessantes e importantes para um princípio de conversa sobre o tema. O significado da expressão, questão com que arrancámos o artigo e a que dedicámos um aprofundado ensaio, é, desde logo, a primeira das áreas abordadas lembrando a todos que aquilo que tantas vezes apelidamos como I.A. não tem um fundamento assim tão sólido. Seguem-se depois capítulos sobre os vários tipos de aprendizagem automatizada, as aplicações da I.A. no mundo real, ou as redes neuronais, descritas em textos simples e com ilustrações apelativas.
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