Crescemos num mundo habituado a distinguir, pelo peso simbólico, que a arquitectura dos edifícios lhes confere parte do seu estatuto. Os museus, ninguém duvida, são dos espaços mais épicos que ocupam as cidades e as galerias, elegantes espaços, geralmente de montras grandes, luzes fortes e disposição sui-generis. Contudo, com o surgimento da internet e o advento da digitalização, criaram-se novos espaços, não físicos, onde a nossa experiência conhece outros limites, se rege por outros vocábulos.
Exemplo disso é o trabalho de Manuel Rossner para a galeria berlinense König Galerie. Em Surprisingly This Rather Works, o artista expande o espaço expositivo para além do espaço físico e criou uma aplicação que nos imerge numa das suas criações site-specific. A app chama-se König Galerie (iOS e Android) e não podia ser mais simples. Depois de descarregarmos e abrirmos a aplicação, somos um pequeno boneco que, como em qualquer jogo, se desloca pelo espaço. A diferença é que neste jogo, em vez de termos uma missão de acção, temos uma missão de contemplação – observar por todos os ângulos os trabalhos do artista.
O trabalho-exposição-jogo transporta para o universo digital o estilo que Manuel Rossner costuma expor ao vivo, mas vale-se da imaterialidade desta sua apresentação para ir mais longe, usando como espaço expositivo uma antiga igreja que é actualmente a casa da König Galerie. É nessa igreja que tudo se passa e é por entre as obras de Rossner que somos convidados a jogar, ou na alusão conceptual do artista, a exercitar. A ideia de Rossner foi criar um ambiente virtual interactivo que se assemelhasse com um ginásio para, ao mesmo tempo que mergulha no universo digital, nos lembrar do salto que a tecnologia dá para o universo real com o treino de sistemas de inteligência artificial como o OpenAi.
Aproveitando o espaço de possibilidades infinitas e o facto de a experiência digital (neste caso) não ter qualquer efeito material nos artefactos expostos, o artista convida-nos a visitar a exposição de uma forma diferente, num percurso que nos convida a saltar por cima de obras a entrar dentro de outras. Apesar de o intuito ser a contemplação das peças, a componente jogável não foi de todo descurada, mesmo sendo relativamente simples reserva algumas nuances que tornam a experiência realmente divertida.
Se o trabalho de Rossner cruza de forma vibrante a pintura e a escultura, este seu avanço para o mundo digital cruza não só o suporte em que a experiência decorre como se aproveita desta mudança para criar uma experiência ainda mais interactiva entre visitante e obra de arte. De resto, o corpo de trabalho do artista alemão já revelava essa tendência para novos meios e formatos, nomeadamente numa exploração constante da relação entre o espaço físico e a realidade virtual.
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