Gerir um órgão de comunicação em tempo de pandemia é um desafio absolutamente novo para todos, e especialmente para aqueles que como nós começaram nesta área há menos de uma dezena de anos. O coronavírus colocou-nos a todos num estado de excepção que é um verdadeiro teste àquilo que andamos aqui a fazer e, simultaneamente, uma oportunidade para pensarmos aquilo em que podemos ser úteis. Foi isto que escrevemos no editorial do Shifter, onde nos comprometemos a informar-te da melhor forma que sabemos, com responsabilidade mas sem pânicos. No início desta jornada, rejeitámos ser mais um órgão de comunicação social a propagar o medo, prometemos que não faríamos da pandemia tema único no Shifter, nem reportaríamos a cada novo caso. Assumimos a responsabilidade de nos mantermos fiéis aos nossos princípios e temos feito os possíveis para que não sermos parte de nenhum dos problemas que esta situação acarreta.
Desde o início que temos tentado transmitir informação preventiva mas activa sobre o Covid19, mostrámos-te como se viveu o início desta pandemia na China, já te ajudámos a dissecar os números, temos-te mostrado os projectos imparáveis da comunidade para responder às dificuldades do contexto, como a Internet tem reagido para reduzir distâncias em tempos de isolamento, no trabalho, ou com amigos e família, criámos uma rubrica com uma lista de leituras pertinentes e interessantes sobre o tema, demos-te música, dicas sobre como seres produtivo no trabalho a partir de casa, ou sobre como combater a ansiedade durante este período, contámos-te histórias sobre outras pandemias, e falámos com o filósofo croata Srećko Horvat sobre o que poderá trazer o futuro depois do vírus e a reacção que agora toma conta dos estados.
Ao mesmo tempo que trabalhamos diariamente para te informar, vivemos a nossa própria fase de isolamento. O sistema de trabalho remoto não é estranho para ninguém da equipa. Há quem esteja a aproveitar as horas de comuta para se dedicar a hobbies antigos e quem sinta que este período de quarentena não interferiu assim tanto com a sua rotina diária. Mas porque todos temos algo a dizer sobre a forma como temos passado o tempo – e porque a nossa equipa de colaboradores não foi escolhida ao acaso (!) – decidimos partilhar contigo o que temos feito para ocupar o vazio criado pela necessidade de ficar em casa.
Há sugestões de livros, filmes, séries, jogos; no geral, actividades que emergiram do tédio da nossa quarentena. O nosso objectivo não é que vejas este artigo como uma lista de conselhos, mas como uma partilha de ideias. Não temos de nos propor a escrever a próxima grande cena, e o mais provável é que muitos destes planos saiam, como tantos outros, furados. O importante é ficar por casa, manter o espírito positivo e saberes que não estás sozinho!
Tempo de livre? Onde? Quando? O quê? – João Ribeiro
Eu estou habituado a trabalhar em casa e por isso a rotina pouco altera. Como um dos responsáveis editoriais do Shifter e o bichinho à flor da pele, tenho ocupado a maioria do que seria tempo livre a ler tudo o que de bom se tem escrito reflectindo sobre este momento ímpar. Assim, o aborrecimento surge apenas quando me obrigo a tal, para que não me deixe consumir em demasia pelo assunto do momento e consiga manter a sanidade mental. Para isso re-activei a minha conta de freecodecamp, para voltar a aprender as bases de programação, re-instalei o Football Manger e o LMMS — software livre de produção musical. Portanto, se me conseguir controlar no consumo obsessivo de informação sobre o assunto, pode ser que consiga programar o site pessoal que ando a adiar há anos, leve o Arsenal à conquista da Champions ou produza um beat manhoso com samples de voz do David Foster Wallace.
A gosto – Mário Rui André
Apesar de me encontrarem frequentemente por Benfica, o Shifter dá-me liberdade para trabalhar onde e quando quiser. Gosto da rotina de sair de casa e de ir para um local diferente trabalhar, que geralmente é esse espaço em Benfica mas às vezes é um café ou esplanada noutra ponta da cidade. Evito trabalhar em casa mas é o que acontece quando venho para o Almograve. Gosto de estar aqui, do sossego, do ar puro, do escape da cidade. Poucas vezes dá para escapar à cidade porque há compromissos que ela nos cria e que nós vamos criando nela. O Covid-19 forçou a capital a fechar e as pessoas a isolarem-se, e sinto que esta é uma pequena pausa na vida a correr que levamos na grande cidade. Se antes passava o tempo fora de casa, agora tenho tempo em casa e estou a gostar de aproveitá-lo. De certo modo, parece que agora é Agosto. Não há eventos, conferências de imprensa ou tanta coisa para cobrir. Há trabalho para fazer e esse ocupa a maior parte do meu tempo, mas espero conseguir aproveitar esta quarentena para criar aquelas crónicas no blogue que ando a adiar há meses, para preparar um novo projecto que já gostava de ter lançado e para editar aqueles vídeos caseiros que ficaram pendentes das férias.
Não gosto de “estar sem fazer nada” então faço demais – Rita Pinto
Ficar de quarentena pouco tempo depois de chegar de um ano a viver fora de Portugal tem coisas boas e más. Por um lado, tenho tempo para matar saudades de casa e família, por outro, não posso matar as saudades que ainda tenho do resto. A circunstância confrontou-me então com uma série de hobbies que cá deixei e adoro, mas que não eram uma prioridade, por isso a minha cabeça tem andado num estado constante de tilt entre ansiedade, produtividade, criatividade e vontade. Deixo-me absorver facilmente pelo que me rodeia e, no meio do trabalho, é difícil não continuar a consumir o que tem sido o tema óbvio do meu trabalho jornalístico nas últimas semanas. Dito isto, da minha quarentena já resultaram umas quantas entradas de Morning Pages, dois sacos de roupa para dar, um curso online de Copywriting, a Masterclass de Escrita Criativa de Margaret Atwood, dois filmes vistos de uma lista de 19 organizada por realizador, muitas aguarelas soltas, livros de colorir e introdução à tinta acrílica, recortes para colagens que ainda não existem e um há-muito-desejado mergulho nas quase 700 páginas de Purity, de Jonathan Franzen. Também comecei a escrever um livro de receitas, estou a ver/rever The Office, ando a sonhar com tocar piano num Casio VL-Tone que descobri em casa dos meus avós, e tenho lutado para não me entregar ao vício dos Sims. Além de tudo isto (tudo inícios sem fim à vista), arranjo-me todos os dias como se fosse sair de casa, e tenho-me focado em contar histórias sobre saúde mental nestes tempos de pandemia, que podes ler aqui.
Procrastinação Produtiva – Duarte Cabral
Durante esta fase de quarentena, acho que convém estabelecer um regime onde devemos ser organizados na forma como matamos o nosso tempo. Aquilo que fiz recentemente foi reservar as manhãs e os fins de noite para completar um jogo que tinha on hold há já uns meses (Dishonored 2), aproveitar o pós-almoço para ler (nomeadamente, o belíssimo Love in the Time of Cholera do Gabriel Garcia Marquez), e ver dois filmes – um antes de jantar, outro após. Numa fase mais turbulenta das nossas vidas, esta consistência é um repelente valioso para o síndrome de eremita que nos espreita dos recantos mais escuros das nossas casas. Além disso, ainda iniciei funções (remotamente) no meu novo emprego, por isso ainda tive de reajustar este meu regime, mas sinto que se me mantiver por estes mesmos princípios, que tudo se irá alinhar da melhor forma.
Máscaras C19 – Milene Santos
Canalizei o problema para a confecção de máscaras de tecido, suportadas por uma pesquisa de materiais, a sua protecção e respirabilidade. Sabe-se que não fazem milagres e que não fazem grande diferença a quem anda na rua, mas parecem ter um papel importante para quem sabe estar infectado e para os que lidam directamente com os casos identificados. Tenho distribuído por amigos que delas precisem, uma vez que o acesso a máscaras está complicado. Não me afasto do tema do momento, é certo, mas no processo tenho escolhido, consoante o mood, Tom Waits, Arcade Fire e Mayra Andrade, entre outros, como companhia.
Isolamento Social? Sim, obrigado. Obrigatório? Não, dispenso – Marco Cotas
Bom, comecei esta quarentena com um “14 dias é uma vida, dá para tudo!”, que me levou a passar os primeiros 6 sem fazer absolutamente nada de produtivo (muito Instagram, muito scroll e sempre com as notícias como voz de fundo). Ah, fiz a barba ao final de muitos anos e ganhei algo entre um “Narcos look” e “O Sr. que está todos os dias de gabardina, atrás dos arbustos”. Com esta procrastinação a começar a ter efeitos na minha sanidade mental, decidi começar a semana com um nova rotina: exercício físico (em videochamada com amigos), trabalhar remotamente e enviar uns currículos para o estrangeiro. P.S.: Coisas que têm ajudado a passar o tempo: séries – Bojack, Mind Hunter, O Homem Que Mordeu o Cão; livros – Anne Frank; jogos – PokerStars.
Troquei as horas da comuta por horas no Sims! – Catarina Coelho
Trabalho em comunicação digital por isso a minha carga de trabalho aumentou consideravelmente neste período. Para relaxar ando a ler bons livros (2666 do Roberto Bolaño) mas também tenho passado largos minutos a jogar Sims. Sem vergonha!
Menos comuta, mais tempo para outros hobbies – Bruno Figueiredo
O tempo aumenta em quarentena, pois desaparecem as horas de estrada. Encontram-se assim novos momentos para ler, ver ou jogar. Há clássicos a rodar na televisão, jogos em promoção e livros incríveis que temos guardados. Chegou a altura de lhes dar uso!
Nos livros, deixo duas sugestões para os amantes de design e comunicação: Ruined by Design: How Designers Destroyed the World, and What We Can Do to Fix It de Mike Monteiro e o The Copy Book: How some of the best advertising writers in the world write their advertising da D&AD e Taschen. No mundo dos jogos de computador vão também dois conselhos: Death Stranding e o The Witcher 3: Game of the Year Edition, que tem andado em promoção.
Flamenco em 2 metros quadrados – Carolina Franco
Quando percebi que tinha de ficar em casa por tempo indefinido pensei que este seria o momento ideal para, finalmente, me lançar ao desafio de ler James Joyce. Acontece que no sítio em que estou não tenho Joyce, mas trouxe instintivamente debaixo do braço o livro que hesitei tirar da mala vezes sem conta no metro para evitar olhares desconfiados – Puta Que Os Pariu, a biografia do Luiz Pacheco escrita pelo João Pedro George. Pelo menos em casa não vou ter olhares indiscretos e posso rir tão alto quanto me apetecer. Gostava de treinar o meu francês, ver os filmes que nunca cheguei a ver e começar a escrever todos os ensaios que já comecei na minha cabeça antes de dormir. Provavelmente não vou fazer nenhum dos três. Manter a rotina e fazer as minhas aulas de flamenco sem riscar o chão nem ir contra os móveis vai ser um desafio diário e peras. Todos os dias vou estar no Gerador a analisar ao milímetro o impacto da pandemia na cultura em Portugal e a convocar, a cada sábado, as pontas soltas desta história pela voz dos seus diferentes intervenientes – de norte a sul do país.
Quarentena Amena – Bernardo Pereira
Com a situação atual em que vivemos, arranjar algo para fazermos durante esta fase de isolamento é difícil mas não é impossível. Matar o meu tempo com ocupações era mais fácil antes de tudo isto acontecer mas se há algo positivo que consigo tirar de toda esta situação é que o tempo de sobra me dá capacidade de explorar todo o tipo de opções disponíveis. Nos primeiros dias e estando o tempo ameno, aproveitei para simplesmente ouvir música e ficar à janela a descontrair sem estar atento ao constante “pânico” que entra pela televisão pelas nossas casas a dentro. À medida que o tempo foi passando, mergulhei cada vez mais no meu leque de opções, aproveitei para actualizar e criar playlists, porque uma boa sessão de música alta (obviamente de dia) em casa nunca fez mal a ninguém e no meu caso ajuda-me a fazer as tarefas de casa, para me reencontrar online com velhos jogos de infância (maioria de telemóvel), consumir ainda mais séries (Devs, The Outsider e On My Block) e voltar a apanhar o mesmo hábito com filmes (The Windermere Children, Just Mercy e Ford Vs Ferrari).
A minha rotina mudou e agora está estruturada da seguinte forma: Fazer o almoço, consumir um filme durante a tarde, preparar-me para estar pronto às 18h30 para mais uma aula online, falar com amigos no Houseparty depois de jantar e, perto da meia noite, consumir outro filme ou uma série caso saia novo episódio. Quanto aos jogos online são aproveitados nas horas de tédio e principalmente no conforto da minha cama antes de deitar.
O gato Ninja é quem mais gosta da quarentena – Diego Garcia
Quem desfruta da quarentena é o meu gato, o Ninja. Juntos acabámos de ver a última temporada de Narcos: México e começámos a ver o documentário Pandemic. Também tivemos tempo de dar início a uma nova leitura, o livro Caminhos Sombrios da Sandra Brown. Aproveitem esta quarentena para ler o livro que ainda não tiveram tempo de ler, de ver a série que ainda não conseguiram ver ou até de experimentar novos hobbies!
Este Viver Caseiro – Helena Trigueiro
A fadiga oferecida pelo isolamento social vai começar a sentir-se agora. A quarentena já não é novidade, o número de pessoas que vão à janela fumar é bem maior do que o número que vai aplaudir, e o duelo diário com a inquietação fica mais difícil de ganhar. Estaremos muito tempo em casa, pelo que é importante garantir que se reserva tempo para fazer algo que nos faça bem. “Aquarela” , canção de Toquinho, diz assim:
“E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo nem piedade
Nem tem hora de chegar
Sem pedir licença
Muda nossa vida
E Depois convida
A rir ou chorar”
Ler – Edgar Almeida
Como estou em teletrabalho não me posso dedicar a séries e filmes como gostaria. No entanto posso parar quando não me sinto produtivo e ler uns 15 minutos, algo que na empresa não seria bem visto, já que a única pausa aceite socialmente é a pausa para fumar. Livros: como normalmente ando de bicicleta e mesmo de transportes não compensa andar a transportar calhamaços, agora estou a aproveitar para terminar os Irmãos Karamazov e começar finalmente a Odisseia. Na obra Irmãos Karamazov, as discussões filosóficas são densas mas o detalhe tanto emocional como mundano dos personagens prendem o leitor e tornam um livro pesado numa leitura agradável. O prazer de ler Odisseia decorre de estar a ler um livro milenar que nos chega como uma viagem no tempo para compreender manias da espécie humana que têm estado inalteradas ao longo dos séculos.
Não sendo costume acompanhar séries, nem tendo muito tempo aproveitarei para ver uma mini série que me deixou muito curioso quando saiu, The Night Of. A série com Riz Ahmed e John Turturro que se foca num crime e numa possível injustiça mereceu todas atenções em 2016 e espero poder finalmente verificar a sua qualidade.
Tal como nos livros estou a procurar ver aqueles filmes clássicos que normalmente não vejo por preguiça de investir muito tempo. Normalmente tento que os filmes que vejo tenham cerca de 1h30, mas nestes tempos de quarentena tenho como objectivo ver (finalmente) Irishman de Martin Scorcese, Seven Samurais de Akira Kurosawa e, se isto durar, o drama histórico sobre o século XX, 1900 de Bernardo Bertolucci.
Como aproveitar a quarentena? – Miguel Melo
Eu já andava a pensar que precisava de ficar em casa, desprender-me da minha vida social exagerada, e ler os 30 livros que ainda não li. Quando a minha empresa nos mandou de quarentena, eu pensei: “Yehey!”. Estou a ler o Senhor dos Anéis, tenho O Capital do Século XXI no seguimento, e À Beira do Abismo para ler em português. Em inglês, tenho que ler Memórias de Sherlock Holmes. Também continuo a fazer críticas de álbuns metal para a magazine online Tempelores.com. Entretanto comecei um programa do Darebee para me manter em forma. Não quero parecer um newb quando voltar a fazer escalada. Também tenho uma infinidade de Animes para ver. Queria acabar Fairy Tail e Castlevania.
Em busca de novos hábitos para vencer o aborrecimento – Pedro Caldeira
Sendo que estou no último ano do meu curso, tenho passado bastante tempo de volta da tese. No entanto, arranjei uns novos hábitos porreiros: ao pequeno-almoço e sempre que me sinto tentado em ir às redes sociais pego num livro e leio qualquer coisa. Atualmente estou a terminar A Sombra do Vento de Carlos Ruiz Záfon e wow, que livro incrível, aconselho vivamente; tenho escrito durante 10 minutos todas as manhãs sobre um tópico aleatório que me lembro no momento; tenho desenhado personagens de filmes/séries como o Tony Soprano ou até mesmo artistas como por exemplo o Childish Gambino. De resto, tenho mantido os meus hábitos normais de fazer instrumentais de hip hop (e algumas letras), passar (demasiadas) horas no YouTube a ver video essays sobre tudo e mais alguma coisa, e dar festinhas no meu gato.
Workaholic alert – Susana Martinho
Estou a trabalhar mais que nunca: desde atualizações de sites, à criação de podcasts, à gestão de redes sociais, ao consumo incessável de conteúdo. Aproveitei a quarentena para vir trabalhar a partir de casa, em Trás-os-Montes. O pessoal do Shifter já sabe que me levanto com as galinhas e que me deito cedo. Aproveito as madrugadas para me aventurar pela natureza – gosto de ver o nascer do sol da colina e caminhar à beira rio, sem ninguém por perto. Quanto posso, ainda de manhãzinha, leio; senão, faço-o à noite. Também me tenho dedicado mais à música, já não posso fugir do piano (nunca o quis fazer, na realidade, mas o tempo, ai o tempo!) e estou a ganhar coragem para voltar ao violino. Fazemos as refeições em família, sempre que podemos. A mãe é enfermeira e já está a fazer turnos de 12 horas; o pai continua na rua, a trabalhar. Eu e a mana ficamos em casa, cá nos entretemos. Às vezes passeamos pelo terreno e pelo parque, de quando em vez treinamos juntas, mas a atividade física não tem estado em alta nestes últimos dias. Por falar nisso, amanhã talvez vá andar de bicicleta e cantarole uma canção. Hoje fico em casa, porque é aqui que devo estar.
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