Neste tempo de quarentena corremos o sério risco de nos sentirmos à deriva no mar inerte do tempo morto, que quanto mais muda mais se inaltera, sem prazo definido de término ou rejubilo na linha do horizonte. As notícias do mundo são muitas e sempre a mesma, cansamo-nos de ouvir e ver as mesmas caras e vozes nos nossos ecrãs, somos facilmente consumidos pelas mandíbulas suaves das nossas camas e desaparecemos nos vazios fundos das nossas almofadas. Precisamos de escapar das quatro paredes que nos rodeiam para outros mundos e realidades onde a magia não se rege somente pelo imaginário, o amor improvável se torna o garantido, explosões são a banda sonora que impera, e os sonhos (e pesadelos) ameaçam engolir a realidade. Eventualmente sabemos que temos de voltar, mas tudo o que queremos fazer neste momento – seja por meios duma série, livro, jogo, música ou filme – é partir.
Mais do que nunca, é importante procurarmos dinamizar as nossas vidas dentro das fronteiras que nelas agora se impõem, e aqui no Shifter temos vindo a tentar ajudar-vos com isso ao longo dos últimos dias. Lançámos uma lista com várias sugestões de séries para verem, começámos a agregar a melhor música nova numa playlist pública, e demo-vos sugestões de apps que vos permitiriam encurtar a distância física e virtual que vos separa da vossa família e amigos.
Continuando com esta linha temática, propomo-vos duas listas de 75 filmes cada para vos fazer companhia durante a atribulação que se avizinha. Numa das listas, perder-se-ão no melhor do imaginário clássico e recente a 24 fotogramas por segundo, viajando por diversos marcos do cinema de género, que vão desde a leveza romântica de filmes como When Harry Met Sally, até à repulsa visceral de algo como Audition. A outra contém uma série de filmes para nos trazer de volta à realidade em que vivemos, apoiada numa série de temas como, por exemplo, a disparidade de classes em I, Daniel Blake, a alienação social em Woman Under the Influence, sem ignorar também a ideia de uma emergência pandémica a nível global, marcada fortemente por Contagion.
Este equilíbrio entre escapismo e realismo é um que temos de manter ao longo das nossas vidas, especialmente em períodos como aquele em que nos encontramos. Esta lista procura precisamente promover essa harmonia mental duma forma que vos deixe entretidos num futuro próximo, ao mesmo tempo que vos apresenta algumas das melhores amostras de cinema que há por aí.
Votos de boa quarentena (e bom cinema) para vós!
Para reflectir…
Capitalismo:
- The Wolf of Wall Street (2013), de Martin Scorsese
- Killing Them Softly (2012), de Martin Dominik
- There Will Be Blood (2007), de Paul Thomas Anderson
- Aquarius (2016), de Kleber Mendonça Filho
- Network (1976), de Sidney Lumet
Racismo:
- If Beale Street Could Talk (2018), de Barry Jenkins
- Do The Right Thing (1989), de Spike Lee
- Selma (2015), de Ava DuVernay
- Malcolm X (1992), de Spike Lee
- I Am Not Your Negro (2016), de Raoul Peck
Abuso e Violência Sexual:
- Spotlight (2015), de Tom McCarthy
- Irreversible (2002), de Gaspar Noé
- American Beauty (1999), de Sam Mendes
- Naked (1993), de Mike Leigh
- The Tale (2018), de Jennifer Fox
LGBTQ+:
- Girl (2018), de Lukas Dhont
- Laurence Anyways (2013), de Xavier Dolan
- Dog Day Afternoon (1975), de Sidney Lumet
- Moonlight (2016), de Barry Jenkins
- Happy Together (1997), de Wong Kar-wai
Relações laborais:
- A Fábrica de Nada (2017), de Pedro Pinho
- I, Daniel Blake (2016), de Ken Loach
- Nos Batailles (2018), de Guillaume Senez
- Jeanne Dielman, 23 Quai du Commerce, 1080 Bruxelles (1975), de Chantal Akerman
- Strike (1925), de Sergei Eisenstein
Desigualdade Social:
- Les Misérables (2019), de Ladj Ly
- Que Horas Ela Volta (2015), de Anna Muylaert
- Shoplifters (2018), de Hirokazu Kore-eda
- La Haine (1995), de Mathieu Kassovitz
- São Jorge (2017), de Marco Martins
Fenómenos Naturais:
- Contagion (2011), de Steven Soderbergh
- Safe (1995), de Todd Haynes
- Children of Men (2006), de Alfonso Cuarón
- Take Shelter (2011), de Jeff Nichols
- Force Majeure (2014), de Ruben Östlund
Tecnologias:
- The Social Network (2010), de David Fincher
- Ex Machina (2014), de Alex Garland
- Eighth Grade (2018), de Bo Burnham
- Black Mirror: Bandersnatch (2018), de David Slade
- Searching (2018), de Aneesh Chaganty
Crise Climática:
- First Reformed (2018), de Paul Schrader
- Dark Waters (2019), de Todd Haynes
- Beasts of The Southern Wild (2012), de Benh Zeitlin
- Woman at War (2018), de Benedikt Erlingsson
- Before the Flood (2016), de Fisher Stevens
Juventude:
- Polytechnique (2009), de Denis Villeneuve
- The Smell of Us (2014), de Larry Clark
- Acid (2018), de Alexander Gorchilin
- Attenberg (2010), de Athina Rachel Tsangari
- The Last Picture Show (1971), de Peter Bogdanovich
Migrações:
- Sicario (2015), de Denis Villeneuve
- The Immigrant (2012), de James Gray
- The Other Side of Hope (2017), de Aki Kaurismäki
- Dancer in the Dark (2000), de Lars Von Trier
- Dheepan (2015), de Jacques Audiard
Guerra:
- Incendies (2010), de Denis Villeneuve
- Monos (2019), de Alejandro Landes
- Beasts of No Nation (2015), de Cary Joji Fukunaga
- Come and See (1985), de Elem Klimov
- The Battle of Algiers (1966), de Gillo Pontecorvo
Privacidade:
- The Conversation (1974), de Francis Ford Coppola
- Citizenfour (2014), de Laura Poitras
- The Truman Show (1998), de Peter Weir
- Caché (2005), de Michael Haneke
- The Lives of Others (2006), de Florian Henckel von Donnersmarck
Alienação:
- Lost in Translation (2003), de Sofia Coppola
- Her (2013), de Spike Jonze
- Melancholia (2011), de Lars Von Trier
- Three Colors: Blue (1993), de Krzysztof Kieślowski
- A Woman Under the Influence (1974), de John Cassavetes
Aborto:
- 4 Months 3 Weeks 2 Days (2007), de Cristian Mungiu
- Swallow (2019), de Carlo Mirabella-Davis
- Saint Frances (2019), de Alex Thompson
- Juno (2007), de Jason Reitman
- Obvious Child (2014), de Gillian Robespierre