A importância de viver para escrever no exemplo de Logic

A importância de viver para escrever no exemplo de Logic

18 Fevereiro, 2020 /

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Depois de 6 mixtapes, 5 álbuns e 1 soundtrack no espaço de apenas 9 anos, Logic ainda é como uma promessa por cumprir.

Entre os vários nomes que têm percorrido o mundo a rappar, Logic é um dos incontornáveis. Sir Robert Bryson Hall II a.k.a Logic, é um rapper americano oriundo de Gaithesburg, em Maryland. Nasceu em 1990 e é descendente de pai afro-americano e mãe caucasiana, que nunca tiveram uma presença muito positiva na sua vida devido a problemas de alcoolismo e abuso de substâncias. Foi graças a uma grande força de vontade e contra todas as probabilidades, que Logic se conseguiu afastar da vida que os pais levavam e de uma vida criminosa. Focou-se a 100% na expressão artística através do Rap, juntamente com 6ix, o seu produtor e amigo de infância, forjando uma carreira invejável em relativamente pouco tempo.

Em 2010, após ter lançado um projeto sob o nome Psychological, lançou a sua primeira mixtape, Young, Broke and Infamous, que pecou pela falta de coesão e não singrou. No entanto, passados apenas 2 anos, lançou a primeira mixtape da sua trilogia altamente conceituada, Young Sinatra, e o jogo mudou.

Esta trilogia seria o início do seu sucesso no mundo da música e a introdução de muitos fãs ao seu trabalho (incluindo eu). Em 2012 lançou Young Sinatra: Undeniable, seguido de Young Sinatra: Welcome to Forever, lançado em 2013. A grande proliferação da sua música deveu-se também em parte devido à grande popularidade do jogo Call of Duty na plataforma YouTube. Muitos jogadores utilizavam as suas faixas enquanto jogavam, o que levou a que a sua fama crescesse exponencialmente. No entanto, esta não foi a única razão pela qual Logic viu sucesso pela primeira vez: a grande razão pelo seu sucesso foi mesmo a qualidade das mixtapes, que ao contrário do que é comum no mundo do Rap, estavam bastante coesas graças à produção fora do vulgar, com recurso a samples de músicas de Frank Sinatra, por exemplo, à escrita e ao flow do artista. Logic entrava assim no mundo da música de uma maneira furiosa e pronto para tomar a indústria por completo.

Foi graças a uma grande força de vontade e contra todas as probabilidades, que Logic se conseguiu afastar da vida que os pais levavam e de uma vida criminosa. Focou-se a 100% na expressão artística através do Rap, juntamente com 6ix, o seu produtor e amigo de infância, forjando uma carreira invejável em relativamente pouco tempo.

Aproveitando esta maré de sucesso e de inspiração, Logic lançou o seu primeiro álbum de estúdio, Under Pressure, em 2014 e assinou contrato com a editora Def Jam no mesmo ano. Apesar de ter sido bem recebido, de certa forma o primeiro álbum de Logic desapontou os fãs do artista que, depois da trilogia, tinham ficado com expetativas bastante altas. De qualquer forma, foi um trabalho bem sucedido em que o artista voltou a demonstrar a sua capacidade para escrever letras bastante vívidas e acompanhá-las de bons instrumentais.

Os anos continuaram a passar e Logic não parou de produzir novos projetos. Em 2015 lançou o seu segundo álbum, que também deixou muito a desejar, tornando-se mais uma vítima do Sophomore Slump — conceito criado para enunciar que o segundo álbum de um artista nunca corresponde às expetativas criadas pelo primeiro. The Incredible True Story procura ser uma experiência cinemática, mas acaba por se revelar uma miscelânea de ideias pouco desenvolvidas e, no geral, mal concretizadas. No ano seguinte, em 2016, Logic lançou uma nova mixtape, Bobby Tarantino. Apesar de voltar ao registo de mixtape, como na trilogia, a qualidade não acompanhou o retorno. Os instrumentais são banais, já não têm a magia que tinham anteriormente e, por outro lado, apesar do flow do artista continuar a ser tão bom como era anteriormente, a qualidade das suas barras também deixou muito a desejar.

É em 2017 que somos então presenteados pelo terceiro álbum de Logic, Everybody. Este álbum é o ponto alto da carreira comercial do artista porque é com a faixa 1-800-273-8255 (uma referência à linha telefónica norte americana de apoio ao suicídio) que Logic finalmente chega às estações de rádio do mundo inteiro. 1-800-273-8255 é uma boa faixa de Pop-Rap que abre o jogo sobre o problema do suicídio e acaba por ajudar bastantes pessoas que se vêem nesta posição. É, no entanto, com o lançamento deste álbum que Logic começa a tornar-se alvo de chacota na Internet, com a proliferação dos memes do “I’m birracial”. De uma maneira simplificada, Logic refere muitas vezes ao longo do projeto que é birracial e como o rapper é evidentemente branco, os ouvintes acabaram por desacreditar o artista e gozar com ele devido à repetição desse facto. Como um todo, o álbum explora um conceito em que Logic encarna como uma pessoa de raça ou religião diferente em cada faixa, tentando, portanto, falar dos problemas que esses grupos costumam enfrentar no seu dia a dia. No entanto, a execução é novamente bastante fraca e Logic acaba por se tornar tanto repetitivo como “foleiro” na maneira como transmite a sua mensagem.

Sem qualquer pausa, em 2018 Logic lança a sequela da mixtape lançada em 2016 e ainda uma sequela em formato de álbum à aclamada trilogia de mixtapes que lançou no início da sua carreira. YSIV é, assim, o quarto álbum do rapper e pega nos mesmos tópicos dos trabalhos de 2012. Apesar do seu esforço por ser apreciado pelos fãs que já o acompanham desde o início da sua carreira, o projeto soa algo estranho, como se fôssemos vestir as roupas que usávamos há 6 ou 7 anos. É verdade que o artista continua a demonstrar os seus dotes e muitos dos elementos presentes ao longo do álbum são claramente “fan service”, no entanto o que foi feito no passado já não soa tão bem no presente e o álbum acaba por perder o potencial que tinha.

Sem pausas, um artista não tem tempo para crescer, experienciar coisas novas e aperfeiçoar a sua técnica, sacrificando a oportunidade de poder melhorar consideravelmente o seu trabalho. Para além disso os trabalhos em catadupa acabam por se tornar repetitivos, criando a sensação de que estamos a ouvir o mesmo álbum, vezes e vezes sem conta, em anos distintos e com uma capa diferente. 

Finalmente, em 2019, Logic lança um livro totalmente escrito por ele, uma banda sonora para acompanhá-lo e ainda um novo álbum. Escusado será dizer que a qualidade destes três elementos não é a esperada de um artista com o legado e a posição social que Logic atingiu. O livro, Supermarket, acaba por ser uma versão juvenil do clássico da literatura Fight Club e a sua soundtrack, onde Logic tenta fazer algo mais Indie, em vez de Rap, não melhora de todo a experiência do mesmo. Nesta altura, já nem a crítica tenta dizer que o conteúdo é bom. Por outro lado, o álbum é possivelmente o pior projeto que Logic alguma vez criou e talvez esteja entre os piores álbuns do ano de 2019, visto que não tem nada de novo. A escrita é imatura e está pouco desenvolvida e os instrumentais são apenas cópias de toda a música mais prolífica dos dias de hoje. Para além disto, muitas das barras são foleiras e até um tanto infantis, algo que não seria de esperar de um artista com a bagagem de Logic. É com este projeto que o artista assiste à maior divisão da sua fanbase e a uma acentuada proliferação de memes sobre si pelas várias comunidades da Internet.

É, portanto, aqui que surge a pergunta “Será que é importante não lançar conteúdo regularmente?” Perante o exemplo apresentado, a resposta mais evidente é que sim: é extremamente importante parar de tempos em tempos e não lançar conteúdo anualmente. Logic é a prova viva de que não fazer pausas é prejudicial para a carreira de um artista. Sem pausas, um artista não tem tempo para crescer, experienciar coisas novas e aperfeiçoar a sua técnica, sacrificando a oportunidade de poder melhorar consideravelmente o seu trabalho. Para além disso os trabalhos em catadupa acabam por se tornar repetitivos, criando a sensação de que estamos a ouvir o mesmo álbum, vezes e vezes sem conta, em anos distintos e com uma capa diferente. 

A questão contudo, pode ser vista de outro ângulo. Para além de ter perdido o foco do seu objetivo, Logic parece também ter pedido a “fome” que tinha para ser o melhor rapper “in the game”. Estando no topo dos artistas mais conhecidos no mundo do Rap e com uma fanbase extremamente dedicada, para quê continuar a tentar criar projetos memoráveis e sólidos? É como quando passamos todos os níveis de um jogo e já não temos vontade de continuar a jogar com o ímpeto que tínhamos antes. Podemos continuar a jogar de tempos em tempos mas nunca com a dedicação que jogávamos outrora.

Depois de 6 mixtapes, 5 álbuns e 1 soundtrack no espaço de apenas 9 anos, Logic ainda é como uma promessa por cumprir. Mas não acredito que o artista vá terminar a sua carreira numa má nota. Se tirar alguns anos para parar, descansar e aproveitar a vida fora da música, pode vir a ganhar algum do foco e da fome que tinha nos primórdios da sua carreira. Por muito que me custe dizer, não é certo que o faça e no final de contas, há sempre a remota possibilidade de que se o artista continuar a lançar projetos tão frequentemente um deles seja bom. Por agora o que podemos fazer é simplesmente ouvir e apreciar os seus trabalhos mais antigos.

Autor:
18 Fevereiro, 2020

Engenheiro Informático de profissão, Pedro Caldeira é um apaixonado por tecnologia e acima de tudo música. Escreve regularmente sobre temas relacionados com tecnologia disruptiva e sobre álbuns e artistas que o inspiram.

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