O Ministro da Economia e o Presidente da Câmara de Lisboa entraram de rompante num Altice Arena ainda cheio – cerca de 20 mil pessoas –, mas só depois de Snowden ter falado. A sua chegada não passou despercebida, tal era a quantidade de pessoas que os acompanhavam e que depressa formaram uma massa escura à frente do palco (quase maior que a dos fotógrafos). Mas, quando foi a vez de Siza Vieira e Medina subirem ao palco para o habitual discurso de abertura, a arena já estava bem mais vazia.
Foi, aliás, no momento em que Paddy Cosgrave, mestre de cerimónias do Web Summit, entrou em palco com Pedro Siza Vieira e Fernando Medina que se começou a dar uma espécie de êxodo geral da sala. Os sectores superiores da arena já estavam praticamente vazios e mesmos cá em baixo, no piso térreo, eram visíveis várias cadeiras vazias – cenário que as câmaras não conseguiram esconder. As filas acumulavam-se junto às saídas, enquanto Siza Vieira, o Ministro, falava (uma vez mais) da velocidade com que a tecnologia muda para logo a seguir Medina, o Presidente da Câmara, repetir (mais uma vez) que Lisboa é uma cidade aberta e acolhedora.
Será que as pessoas já não têm “pachorra” para este palavreado político? Ou será que foi o facto de ser já hora de jantar que pesou na decisão? Ou terá sido uma mistura dos dois? Certo é que os discursos políticos, bem como a “abertura oficial” do Web Summit – o momento em que Paddy, Siza Vieira, Medina e algumas start-ups estão em palco para pressionar um botão e soltar confetes – parecem coincidir, ano após ano, com a abertura dos noticiários das 20. Dos três canais, só a TVI preferiu puxar Sócrates e Tancos para a abertura do seu telejornal; poucos minutos depois das 20, RTP e SIC estavam em directo da arena, mesmo a tempo de ainda apanhar Medina a falar e todo o momento dos confetes.
Em 2018, os noticiários puderam abrir com Guterres, Costa e Medina; e, no ano anterior, o Telejornal não abriu com o Web Summit mas foi em directo para o antigo Pavilhão Atlântico quando o Primeiro-Ministro entrou em palco. Apesar da instantaneidade das comunicações, as 20 horas ainda são um timing importante. Afinal, o Web Summit pode ser um evento que não interessa a todos mas interessa ao poder político que todos o vejam a aparecer num evento que custou trazer para Lisboa e a manter na capital portuguesa. Poucos são as oportunidades que os líderes têm para passar uma mensagem que consideram positiva e com um aparato capaz de impressionar qualquer um em directo nas televisões nacionais; o Web Summit servirá para isso e todo aquele ambiente de festa estabelece o tom dos discursos por muito repetitivos e sintéticos que estes sejam na realidade.
Só que a festa que se viu nos anos anteriores não foi igual à deste ano. Também nos telejornais foi possível reparar numa arena mais vazia que nos anos anteriores na “hora dos políticos”. Pode também ter sido o “cartaz” mais fraco.Todos os anos a estrutura costuma ser a mesma: Paddy Cosgrave a dar as boas-vindas, algumas keynotes com convidados especiais e geralmente uma celebridade. Este ano tivemos Snowden a esgotar o Altice Arena, duas mulheres empreendedoras à conversa com Filomena Cautela, um executivo da Huawei a falar do 5G (numa keynote que mais parecia um anúncio – a Huawei é uma das grandes patrocinadoras do Web Summit) e um painel com o actor e músico Jaden Smith a falar sobre água.
Em 2018, o Web Summit abriu com o criador da WWW, Tim Berners-Lee, com Lisa Jackson, da Apple, com o realizador Darren Aronofsky e, por fim, com António Guterres, das Nações Unidas. Nesse ano, Costa e Medina assistiram à cerimónia desde o início. Este ano, 4ª edição do Web Summit em Lisboa, Medina e Siza Vieira (Costa estaria ocupado noutro evento) entraram só depois de Snowden acabar, mas não imediatamente a seguir – houve um breve compasso de espera que pode ter sido para camuflar a coisa. O Governo e a Câmara não terão estado em Snowden para evitar interferências diplomáticas num caso judicial e politicamente complexo.
Assim, restaram as palavras mais ou menos vãs, as promessas mais ou menos realistas, os sorrisos de circunstância, os confetes e pouco mais – afinal de contas, com tanto por onde pegar do ponto de vista política é sempre uma opção mais segura seguir a velha fórmula de esperar pelas 20, fazer o discurso velado e terminar com acenos que pouco comprometem.
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