1. Gosto muito de ler o Vítor Belanciano, no P2, ao domingo. É um grito lento de liberdade, que faz pensar diferente e não assusta ninguém. Uma rebeldia suave, uma janela que se abre lentamente, silenciosamente.
Gosto muito de ler a Ana Cristina Leonardo, no Expresso. Uma revolução de referências, uma tempestade perfeita que não encerra sem um final feliz.
Mas gosto mais de ler o Miguel Esteves Cardoso, no Público, todos os dias, sempre que posso. No metro, em casa, em todo o lado, parafraseando o lema de uma rádio qualquer. O MEC é que me faz pensar, e pensar que gostaria de escrever como ele. E faz-me olhar para o que interessa e pensar que o que interessa está permanentemente em mudança.
Aprendi com o MEC a tentar saborear o gosto das coisas boas da vida e a tentar escrever com a maior simplicidade possível. A gastronomia, um poema. As coisas existem para ser preenchidas de vida, insufladas de valor. O nosso investimento é o tempo. O amor é uma idade. Somos simples.
Há amigos que nos falam dos assuntos importantes para o mundo. E há amigos que nos falam dos assuntos importantes para nós. Por vezes ambos coincidem, outras vezes não. Os primeiros alertam-nos para a necessidade de sermos mais. Motivam-nos, dão-nos coragem, fazem-nos mexer. Os segundos sentam-se connosco, abrandam e enchem-nos mais um copo de vinho. Gostam de estar no silêncio connosco. O MEC, embora não o saiba, é meu amigo.
2. O querido mês de agosto é uma vírgula na vida acelerada. Uma pausa que dá para respirar o bafo quente do Verão a morrer ao fim da tarde na espuma algarvia. Ou então a morrer no calor infernal do interior em chamas, para onde se olha com interesse voyeurista e comercial. As redações televisivas não sabem que Trás-os-Montes e o Alentejo existem também durante o Inverno, e há mesmo quem lá viva diariamente, e produza, e faça erguer construções, e crie crianças, e tenha história.
Usamos a métrica errada para avaliar a nossa atuação, e dela tiramos felicidades injustificadas. O interior não se mede em área ardida. O interior é uma idade. Estamos velhos e cansados. Somos simples.
O mês de agosto também é uma oportunidade para sermos sinceros. Quando estamos estendidos num areal qualquer, sob o jugo de um sol incandescente, nada mais nos interessa. Aceitamos a preguiça que passámos o resto do ano a negar. Nem sequer nos importamos de comer a bola de berlim temperada com areia e gotas de sal. Precisamos de sofrer muito o ano inteiro para ter um mês de agosto saboroso.