O escândalo da Cambridge Analytica não foi apenas um caso de uma empresa que usou dados de utilizadores do Facebook para manipular resultados eleitorais nos EUA e no Reino Unido. Foi uma história absurda em termos de complexidade e que, provavelmente com o passar do tempo, se tornará mais clara; neste momento apenas temos um documentário acabado de sair no Netflix e que basicamente explica porque é que a Cambridge Analytica é um assunto importante.
Não é pela Cambridge Analytica. De todo. The Great Hack, assim se chama o documentário na versão original (Nada é Privado: O Escândalo da Cambridge Analytica, na versão portuguesa), é sobre uma sociedade que, iludida com o sonho de um mundo interligado, entregou os seus dados pessoais a empresas de tecnologia, não reguladas, que os exploram em negócios multimilionários e que não dão garantidas de privacidade.
In The Great Hack, former Cambridge Analytica employees explain how they used Facebook to influence the 2016 presidential election pic.twitter.com/tEQ3CezSV0
— Netflix (@netflix) July 24, 2019
É sobre a realidade filtrada que as plataformas digitais nos providenciam, onde tão facilmente é possível criar e espalhar conteúdo propagandista, direccionando-a a alvos específicos e frágeis através da organização de inúmeros dados em perfis-tipo. Em última instância, é sobre como a internet pode e está a ser usada para manipular indivíduos, um a um, e dividir o mundo, com consequências em eleições sérias e que merece a nossa reflexão – dos EUA ao Reino Unido, passando pelo Brasil.
Mas The Great Hack não deixa de ser um documentário sobre a Cambridge Analytica, que levanta, por exemplo, a questão sobre esta se trata de uma empresa criminosa ou não. O filme conta com a participação especial de David Carroll, professor universitário que se envolveu numa batalha judicial com a Cambridge Analytica para reclamar os seus dados, e de Carole Cadwalladr, jornalista do The Guardian que, em conjunto com o whistleblower Christopher Wylie, tornou pública a primeira parte da história sobre a Cambridge Analytica.
O documentário, contudo, não foca a sua atenção em Wylie, mas em Brittany Kaiser, que trabalhou directamente na Cambridge Analytica e ao lado de Alexander Nix nas campanhas de Trump e do LEAVE.EU (Brexit). The Great Hack procura retratar a luta interior de Kaiser, que diz ter muito para reflectir depois de ter trabalhado na Cambridge Analytica e de ter ajudado Nix nos seus objectivos de mexer com resultados eleitorais.
The Great Hack não é suposto ser um documentário que nos sugere respostas e soluções, mas antes que levanta perguntas e nos deixa a pensar sobre o lado obscuro da internet, que discretamente influencia o mundo real de formas sem que muitas vezes nem nos apercebamos. É uma história nova, sobre dados, sobre tracking, e que deve ficar nos livros de História. Por agora, é uma história que recomendamos ver no Netflix. São duas horas de documentário bem investidas. Porque temos de conseguir compreender este mundo, antes que seja tarde demais.
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