Segundo o Observatório das Migrações (OM, equipa pertencente ao Alto Comissariado para as Migrações), em 2017, o número de refugiados e deslocados situava-se nos 68,5 milhões, sendo mais de metade deles crianças. Este número cresceu mais de 50% nos últimos dez anos, com a Síria a representar o país com mais saídas. Enquanto que a Europa tenta lidar com a repartição de refugiados pelos Estados-membros e solucionar o caso de Miguel Duarte, o Canadá em face do mesmo problema há anos atrás optou por outra estratégia para a inclusão.
O Programa de Apadrinhamento Privado de Refugiados (Private Sponsorship of Refugees Program, em inglês) não é uma iniciativa nova incentivada pela crise dos refugiados desta década. A iniciativa nasceu em 1978 na sequência da crise de refugiados da Indochina, quando milhões de pessoas abandonaram as antigas colónias francesas da Indochina (Vietname, Camboja e Laos) depois da tomada de poder por parte de governos comunistas.
O programa mantém-se ativo até aos dias de hoje e afirma-se como um modelo de inclusão por parte de privados em relação a refugiados. De forma simples, o objetivo parte da ideia segundo a qual os refugiados podem estabelecer-se no Canadá com ajuda de financiamento privado ou público-privado; ao limite, basta um grupo de 5 pessoas entre as quais pelo menos 3 dispostas a financiar a vinda e inclusão do migrante para que a pessoa possa ser acolhida.
“Embora o envolvimento privado nas chegadas de refugiados possa assumir múltiplas formas, é comummente entendido que os Programas de Apadrinhamento Privado se referem a parcerias público-privadas entre governos, que facilitam a admissão legal de refugiados e atores privados, que fornecem recursos financeiros, operacionais, sociais e/ou apoio emocional para receber e assentar refugiados na comunidade. Os apadrinhamentos privados ou baseados na comunidade têm sido associados principalmente à experiência canadiana, onde, nos últimos 30 anos, mais de 300 mil refugiados foram apadrinhados, aumentando em 46% a taxa de reassentamento de refugiados canadianos”, pode ler-se no site da Cáritas, como forma de balanço deste plano.
No caso deste apadrinhamento é da responsabilidade dos voluntários encontrar um sítio para o beneficiário viver, dar apoio financeiro, social e emocional. O programa termina quando passar um ano desde o início da ação ou quando o refugiado mostrar ter a capacidade de se sustentar a si próprio. Os voluntários não estão autorizados a pedir dinheiro ou outra forma de pagamento aos beneficiários do programa. Além das ajudas por parte de pessoas singulares, o projeto permite que organizações se juntem ao Governo na ajuda a refugiados.
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— Justin Trudeau (@JustinTrudeau) January 28, 2017
A abordagem europeia com mérito canadiano
O exemplo do Canadá acabou por influenciar a abordagem em relação aos refugiados noutros países da Commonwealth, como o Reino Unido e a Austrália, e também na Europa.
Com a crise dos refugiados às portas da Europa, o Canadá serviu de exemplo para alguns países europeus. Atualmente, a França, Bélgica e Itália possuem programas de inclusão com semelhanças ao projeto canadiano, com a particularidade de serem liderados por igrejas. Desde há cerca de três anos que organizações religiosas assinaram acordos bilaterais com os seus Governos criando mecanismos público-privados de acolhimento. As organizações localizam os refugiados e fornecem sustento no decorrer de um período mínimo de um ano, nestes casos, na respetiva paróquia sendo a proveniência dos fundos são maioritariamente de origem eclesiástica.
Recorde-se que no exemplo canadiano são várias as tipologias de grupos elegíveis como voluntárias no acolhimento, desde organizações sem fins lucrativos até indivíduos organizados nos chamados “Groups of Five”.
Já no Reino Unido, o programa apresenta algumas diferenças em relação à política de refugiados. Lançado em 2016, e dirigido pelo Home Office do Reino Unido, este programa apresenta-se como uma vertente do Regime de Reassentamento de Pessoas Vulneráveis da Síria (VPRS, em inglês). O programa é financiado pelo Governo e conta com cerca de 20 mil vagas para o período de 2015 a 2020. Todas as instituições podem-se inscrever para ajudar os refugiados, mas com alguns requisitos: têm de apoiá-los durante um ano, garantir casa durante dois anos e uma ajuda financeira de 12 mil euros. Ao Governo cabe financiar alguns dos custos, incluindo o alojamento.
Os programas de apadrinhamento de refugiados estão também a ser pensados na Alemanha e Irlanda. Num estudo realizado pela Comissão Europeia sobre a viabilidade dos esquemas de apadrinhamento, o Reino Unido foi o território europeu que mais reassentou indivíduos entre 2013 e 2017.