Uma jornalista e um inspector da política judiciária contra o poder político instalado. É este o enredo de Teorias da Conspiração, série que a RTP estreou no final de Janeiro deste ano e que teve o seu último episódio a ser transmitido no final de Maio; Teorias da Conspiração trata através de uma narrativa de ficção os bastidores de um país real como Portugal, podendo a ajudar a descodificar o que se passa atrás das cortinas do mundo político, algo que no dia-a-dia e através da comunicação social não é claro.
É arriscado dizê-lo mas Teorias da Conspiração pode ser uma série importante para a compreensão da democracia. Num mundo em que o trabalho subtrai o tempo para pensar e escrutinar a envolvente, levando-nos a acompanhar as novelas políticas que a comunicação social (também sem tempo) nos vai contando, Teorias da Conspiração propõe, através da ligeireza da ficção, uma reflexão sobre os meandros das relações de poder, convidando-nos a ganhar maior noção dos desafios reais e das questões em que devemos realmente investir as nossas energias. Afinal, a ficção televisiva pode também ter um papel no sentido de nos tornar mais despertos e conscientes.
Teorias da Conspiração não trabalha um grupo pequeno de personagens e as suas histórias. Ao invés disso, apesar de focar a nossa atenção em alguns protagonistas centrais na história, introduz-nos ao longo dos 18 episódios a diferentes personagens, que vão rodando, aparecendo e desaparecendo na série, e cujas histórias muitas vezes vamos conhecendo sem grande profundidade. No final, ficamos com uma perspectiva alargada das jogatanas de influência que ocorrem entre a política, a justiça e as grandes empresas – e é imediato reconhecermos na série casos que marcaram o panorama português nos últimos anos, referências ao regaste do FMI, à governação desde Sócrates a Costa, às crises que bancos como o BES provocaram, ao lobby que as empresas conseguem fazer, às parcerias público-privadas como a do SIRESP, etc.
Sem nunca concretizar ou especificar determinado acontecimento, Teorias da Conspiração é uma espécie do Portugal recente em resumo. A série é também se debruça também sobre a comunicação social enquanto contra-poder, destacando a sua importância para controlar o poder quase absoluto de políticos e grandes empresários, na série simbolizado pelo advogado Pedro Soares Teixeira (Gonçalo Waddington); não deixa de fora temas como a investigação jornalística, a blogosfera, os novos órgãos de comunicação social digital e independente ou a assessoria de imprensa do lado do Governo, sempre muito cauteloso com que vem a público e com as narrativas que conta – e que nem sempre contam a verdade.
Teorias da Conspiração, não esquecer, é um produto de entretimento, no qual algumas personagens – nomeadamente as principais – são exageradas com o propósito de passar a mensagem pretendida. Maria Amado (Carla Maciel) é uma jornalista destemida e José Madeira (Rúben Gomes) é um PJ sem medo de prejudicar a sua carreira para fazer justiça, mesmo que por vezes essa justiça tenha motivações pessoais.
Às vezes, Teorias da Conspiração pede uma pausa e um voltar atrás para perceber determinado tema que é tratado com a rapidez que um episódio de menos de 50 minutos pede, mas no visionamento não devemos estar muito preocupados com isso; mesmo que não percebamos determinado aspecto o crucial é que entendamos as teias de relações que unem o poder, o dinheiro e a corrupção, os banqueiros e os políticos, a investigação jornalística e a judiciária, o crime, a vingança e o amor. Porque, afinal, está tudo ligado. Teorias da Conspiração pode ser um produto de ficção mas mostra que o que muitas vezes ouvimos dos políticos, das empresas e da comunicação social também é um produto de ficção.
Transmitida em horário nobre à sexta na RTP1 (depois do programa de investigação jornalística Sexta Às 9), Teorias da Conspiração é uma série escrita por Artur Ribeiro e também por Paulo Pena – jornalista, passou pelo Diário de Notícia, Visão e Público, integra o consórcio internacional de jornalismo de investigação Investigate Europe, acompanhou de perto os bastidores das crises bancárias que assolaram Portugal. A série foi produzida pela Stoptline, de Leonel Vieira, e realizado por Manuel Pureza, o mesmo realizador de novelas da SIC e TVI, e que já tinha dirigido séries para a RTP como Ministério do Tempo. Artur Ribeiro, que trabalhou o argumento da série com Paulo Pena, também escreveu as novelas Jogo Duplo e Santa Bárbara para a TVI. Que este historial não sirva de desmotivação: Teorias da Conspiração tem detalhes ao nível da realização e fotografia muito bons, além do argumento rico como já esmiuçado.
Teorias da Conspiração já saiu do ar, mas pode ser vista (ou revista) em alta definição – 1080p – no serviço de streaming RTP Play.
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