Uma semana depois de receber Conan Osiris, Surma, First Breath After Coma e muitos outros artistas no Festival Impulso – num evento com direito a artigo aqui na Shifter —, a festa continuou pela cidade das Caldas. Desta vez com uma festa que já tem o nome bem marcado na cidade. O Caldas Late Night celebrou o 23º aniversário com uma festa de três dias, como tradicionalmente faz.
Nestes dias, é normal caminhar pela cidade e ver portas de casa abertas. Funciona como convite, feito pelos alunos da Escola de Artes e Design das Caldas da Rainha (ESAD.CR) para entrarmos e descobrirmos algo de novo. Dança, Teatro, Musica, Instalações, artes performativas… é sempre uma surpresa. Os estudantes abrem a porta ao público para demonstrarem aquilo que fazem e gostam de fazer. Num ambiente muito particular, a partilha de ideias e o convívio acontece naturalmente.
A abertura das casas é o mote para boas conversas com os estudantes que nos recebem rodeados de arte – muitas vezes, a sua própria arte –, e nos contam aquilo que querem transmitir quando desenham, atuam ou pintam. A simplicidade das coisas ganha uma dimensão superior no Caldas Late Night, e uma conversa sobre uma pintura pode rapidamente escalar para um debate sociocultural sobre variados temas.
Toda a cidade se envolve num espírito irreverente. Os estudantes da ESAD fazem jus ao legado deixado pelo ilustre artista caldense José Malhoa, e elevam a cidade de volta ao expoente máximo da sua criatividade.
As festas decorrem por toda a cidade. Os bares juntam-se ao evento e promovem também alguns artistas através da exposição de fotografias, de pintura ou de quadros. Alguns dos mais conhecidos – o Demode, O Ilha ou o Deja vu – são parceiros dos estudantes há largos anos, sendo reconhecidos como pontos obrigatórios de passagem. Pela Praça 5º de Outubro (praça dos bares) passam milhares de pessoas durante os três dias; durante as tardes, é recorrente ver adolescentes e adultos de mapa na mão “à procura da casa” para visitar.
Há sempre música na rua, para todos os gostos. Se há manifesto reiterado pelo CLN, é de que a Arte, na sua natureza, é para todos.
A irreverência está no ADN da Cidade — o tradicional falo é demonstração disso mesmo – e o CLN é embaixador desse estado de espirito. Em tempos realizou-se a “Corrida do Caral#o”, mas se há evento icónico é a Pillow Fight. Já com alguns anos de história, leva autênticos guerreiros almofadados a um combate que só deixa penas no chão e muitas gargalhadas como marca.
As noites são longas e vários são os pontos de encontro. Muitos juntam-se em casas, mas a meio da noite todos os caminhos vão dar à “praça”. Vários artistas tocam no anfiteatro, bem no centro da Praça 5º de Outubro, enquanto as pessoas vão chegando, quase sempre em grupo. Dali para os Silos não são mais de 10 minutos a caminhar sendo e pelo caminho as paragens são recorrentes. Para ver uma casa que ainda está aberta, parar num bar ou mesmo apenas para conversar com alguém, são muitas as possibilidades. Certo é que, se a praça estava cheia de público, os Silos não ficavam atrás. Com vários palcos e bares, a música e a convivência continua, e, no meio de muitas conversas, percebemos que estamos perante um evento que traz gente um pouco de todo o lado. Pessoas provenientes de Leiria, Lisboa e um pouco de todo o país marcam presença no Caldas, que faz questão de receber todos de braços abertos.
A festa de encerramento decorre junto ao recinto onde joga o Caldas Rugby Clube, sendo natural que se vá ouvindo pelas ruas “Vais ao rugby?”, o que, para quem está fora do contexto, pode parecer estranho. Aqui, novamente, vários palcos e vários artistas animam a noite, até de manhã.
Esta festa é muito mais que concertos e atuações. É o grito de muitos jovens artistas e o momento de mostrar aquilo que são as suas criações originais. É um momento de autopromoção perante a cidade e o público. Se em alguns momentos a comunidade das Caldas e a ESAD.CR estão afastados, o Caldas é o momento de união, pois as Caldas e o Caldas vivem uma história conjunta.
A originalidade e a personalidade artística da cidade – vincada por muitos artistas, entre os quais José Malhoa e Rafael Bordalo Pinheiro – está bem representada, e os estudantes da ESAD.CR carregam e elevam o seu legado. Hoje a cidade das Caldas da Rainha é reconhecida internacionalmente como uma a cidade criativa pelo seu passado, presente e potencial futuro.
Texto de André Cardeal Santos
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