Existe em cada bairro, uma cidade, uma vila… uma história ou um beco que nenhuma app – por muito boa que seja – te pode aconselhar a visitar ou ajudar a conhecer. Esses locais são conhecidos por aqueles que lá vivem (pelos chamados locals) e não estão ao alcance dos turistas.
Assim, por vezes a melhor forma de conhecer verdadeiramente um lugar é através dos seus habitantes e é exactamente esta filosofia que a Irlanda está a aplicar com o seu programa My Streets Irland. O principal objectivo é combater o crescente o número de sem abrigo no país.
Um pouco de contexto
Tal como em Portugal, a Irlanda tem vindo a ser alvo de um crescente número de turistas todos os anos, o que traz bastantes benefícios para o país, mas também alguns problemas com os quais já estamos familiarizados nomeadamente, o aumento significativo do valor das rendas dentro das grandes cidades.
Em Dublin, nos últimos quatro anos, as rendas aumentaram cerca de ¼ do seu valor, levando a que surja um grande problema quando estes números acabam por não ser acompanhados no que toca aos salários dos irlandeses. Ou seja, o preço da habitação encontra-se inflacionado pelos turistas com maior poder económico que visitam, e se estabelecem, no país, acabando os nativos por sofrer as consequências – parece familiar?
Tudo isto acaba por gerar uma bola de neve e um dos seus efeitos é o aumento do número de pessoas que não consegue pagar todos os meses a renda da casa (inflacionada pelo poder económico dos turistas), levando a que muitas destas pessoas perca a sua habitação e se torne sem-abrigo. Na Irlanda atingiu-se o número recorde de 10 mil pessoas sem uma casa para viver, sendo que 1/3 são crianças.
A solução
O programa My Streets Irland – uma das cerca de 1 400 iniciativas sociais do país para enfrentar os problemas sociais e ambientais –, tem como propósito principal proporcionar aos sem-abrigo uma nova fonte de rendimento enquanto contribuem para a comunidade, através de visitas guiadas e personalizadas aos turistas.
Durante três meses, os participantes deste programa recebem formação em storytelling, performance e escrita criativa. Finalmente, já quando se encontram a trabalhar recebem 50% do valor dos bilhetes vendidos, enquanto que a outra metade é usada para reinvestir novamente no crescimento do próprio programa.
Deixamo-vos alguns exemplos de testemunhos, contados na primeira pessoa, que mostram a importância desta iniciativa para aqueles que realmente encontram nela a possibilidade de um recomeço.
O director do programa, Austin Campbell, diz que este oferece aos seus participantes uma fonte de rendimento, ao mesmo tempo que lhes dá um novo sentido de vida. “Cada guia cria a sua própria rota, o que acaba por ser um pouco diferente do típico passeio pela cidade”, refere Austin, que conta com o apoio da incubadora Social Entrepreneurs Ireland.
Continuem com o “My Streets Irland”
Como referido no início deste artigo: os segredos de um lugar não serão desvendados numa aventura de dois dias guiada pelas sugestões de uma aplicação ou pelas recomendações de outros utilizadores que por lá estiveram, na sua maioria também eles como turistas. Por outro lado, é sempre de louvar quando surge uma iniciativa que procure contribuir para a diminuição do crescimento de pessoas sem abrigo.
A ideia do programa My Streets Irland parece o início de algo que pode muito bem ser adoptado por outros países em todo o mundo. Faz, por isso, sentido acompanhar o desenvolvimento deste programa e esperar um dia ver este sistema implementado nas nossas cidades.
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