Há muito que se propaga o mito de que o cinema está morto; ainda assim as salas de cinema continuam a manter-se (quer dizer… mais ou menos) e a produção cinematográfica até tem conhecido dias simpáticos. Os prémios para o cinema português têm sido uma constante — desde As 1001 Noites de Miguel Gomes até Diamantino de Gabriel Abrantes, passando por Colo de Teresa Vilaverde — mas nem isso parece convencer o comum espectador nacional a aderir a este género.
Os dados são provenientes de um grande relatório disponibilizado pelo Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA) e, apesar de não terem tido grande expressão na imprensa nacional, são de tal modo estranhos que rapidamente chegaram ao país-vizinho, merecendo destaque no El País. Este é um relatório periódico que costuma ser feito pelo ICA mas que nesta edição inclui, pela primeira vez, uma série de dados referentes a filmes não financiados pelo Instituto, bem como alguns apontamentos estatísticos sobre a promoção de filmagens em Portugal protagonizado pelo Fundo de Apoio ao Turismo e Cinema, e que permite obter um retorno de até 30% das despesas de produção elegíveis.
No documento podemos encontrar alguns dos filmes feitos em Portugal durante o ano transato, tanto curtas como longas; na súmula de obras não constam contudo as produções internacionais que deram origem a alguns dos grandes filmes assinados por realizadores portugueses. Contudo o que mais chama a atenção não são as produções mas sim os dados estatísticos, em particular aquele que começamos por referir no título.
Segundo os dados do ICA, em percentagem de espectadores, o cinema português tem uma quota de mercado de apenas 1,9%. Isto é, no total acumulado de espectadores, apenas menos de 2% paga para ver em sala obras de língua portuguesa. Um dado que se explica desde logo pela fraca adesão ao cinema europeu — com uma quota de mercado de 8,4% —, e pelo sucesso comercial do cinema americano — 71,3% — ou de co-produções entre Europa e América — 19,2%. Estatísticas que se ilustram perfeitamente olhando ao número de espectadores dos filmes mais vistos num e noutro universo. Se no caso dos filmes nacionais mais vistos o recorde é de 46 mil espectadores, a película internacional mais vista registou um total de 605 mil espectadores.
De resto, é preciso dizer-se que esta baixa procura por cinema português — é o número mais baixo de espectadores dos últimos quatro anos — não está directamente relacionada com a oferta, uma vez que 2018 foi um ano em que o cinema nacional esteve bem representado nas salas, com um total de 34 produções entre os 398 títulos com estreia nas salas nacionais.
Colocando os dados numa perspectiva global e seguindo as pistas levantadas na peça do El País, percebemos que a baixa afluência dos espectadores portugueses torna o apoio público à produção cinematográfica caro e pouco valioso — algo que uma peça do NIT já tinha evidenciado no ano passado. Em Espanha, por exemplo, a percentagem de filmes espanhóis consumidos é de 17%, sendo que neste capítulo apenas a Croácia regista percentagens inferiores a Portugal.
Os dados acabam por se explicar entre si, pela preferência do espectador português por obras internacionais mas também se explicam pelos hábitos de consumo em geral onde as plataformas de streaming vão ganhando terreno. Mas também neste particular Portugal não sai propriamente a ganhar. Se é possível encontrar películas recentes de produções um pouco por toda a Europa, a oferta de material português é relativamente no serviço mais popular, o Netflix, destacando-se neste campo o surgimento de opções alternativas como o Filmin onde é possível encontrar uma oferta mais ampla e actual.
Para o ano 2019 estão ainda agendas algumas estreias sonantes neste particular, tais como: Snu de Patrícia Sequeira a 7 de Março, Chuva É Cantoria na Aldeia dos Mortos de João Salaviza e Renée Nader Messora a 14 de Março e Diamantino de Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt, o filme Variações de João Maia, entre outros — uma lista mais completa das novas produções pode ser conhecida aqui.
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