Estou a brincar. Não passei uma semana a comer arroz. Mas vocês clicaram, que no fundo é o mais importante.
Se isto fosse um site mais dúbio, e se vocês fossem utilizadores menos cautelosos, o vosso ecrã estaria por esta altura colonizado de pop-ups simpáticos. É assim a internet. O que eu quis foi a vossa atenção. E vou continuar a sugá-la como um vampiro suga o sangue a donzelas distraídas.
Também falamos de pseudociência. Mesmo alguns organismos de informação bem reputados e massivamente difundidos pelas redes produzem conteúdo baseado nesta premissa: um indivíduo corajoso vai partir numa aventura arrojada com o objetivo de provar um ponto.
Mas não vai sozinho. Normalmente contacta o autor de um livro ou documentário reputado (um best-seller motivacional ou de lifestyle será a melhor escolha para o efeito), que o vai guiar nesta sua nova aventura. O ideal é recrutar um coach.
Segue-se uma infusão exótica de dietas do paleolítico, de auras espirituais, de meditação como solução para todos os males. Se todos andamos tão ansiosos, então é evidente que a solução é tirar essa ansiedade do organismo, depurar as energias com boas doses de mindfulness (há muitas aplicações para isso, e nós vamos todos descarregá-las porque, de facto, estamos stressados). Tudo isto através de práticas e produtos naturais, isentos de químicos. Nada há de mais natural do que a estupidez, ao que parece.
“Uma semana sem telemóvel”. “Um mês sem comer carne”. “Um ano sem pentear o cabelo”. Digamos que o terreno é fértil para este tipo de experiments.
Não é que este tipo de aventuras não possa ter valor para quem as lê, o problema é que este valor é limitadíssimo.
Quer seja pela variedade de experiências, de sensações, de preparação prévia, de caraterísticas individuais, a verdade é que há na vivência própria uma essência incomunicável.
Para além de ser totalmente avesso ao método científico — que é a fonte do conhecimento formal —, este tipo de artigos e experiências têm frequentemente finalidades lucrativas que não são assumidas com clareza.
Mais do que isso, produzem no leitor a sensação de que de este deveria ser algo que não é, deveria fazer algo que não faz. Eis, talvez, o busílis.
É que só porque um milionário americano alegadamente dorme duas horas por noite, não é muito plausível que a senhora Arminda da lavandaria vá obter grandes resultados com esse método.
E só porque um escritor do século XIX passava quatro horas todas as manhãs a ler e a escrever, desculpem, mas não me parece que tal se aplique ao Francisco, que teve o azar de nascer no bairro da Jamaica e não consegue ler nem estudar com o barulho infernal de discussões numa casa onde, por faltar o pão, falta também a razão.
O que a motivação, os métodos alternativos, os coaches de lifestyle querem, no fundo, é vender e frustrar. Decidi não aceitar a oferta. E hoje comi batatas.
Texto de Pedro Ramos