O factor Moon na diplomacia americana e o ano em que se pensou que o mundo ia acabar

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O factor Moon na diplomacia americana e o ano em que se pensou que o mundo ia acabar

A cimeira de Trump e Kim será mais um passo no caminho diplomático que pautou a campanha eleitoral de Moon em 2017. Na Coreia do Sul e nos EUA pedem-se resultados concretos.

Em 2017, Donald Trump inaugurou uma nova era nas políticas americanas para a Coreia do Norte. A sua estratégia inicial ficou conhecida como strategic accountability, em oposição à strategic patience da https://staging2.shifter.pt/wp-content/uploads/2021/02/e03c1f45-47ae-3e75-8ad9-75c08c1d37ee.jpgistração Obama. A sua principal preocupação foi, através de sanções aplicadas multilateralmente, levar a Coreia do Norte a desnuclearizar-se total e irreversivelmente.

A abordagem da nova Administração foi, na sua maioria, semelhante à de Obama. Apostou na pressão internacional e no multilateralismo para conter a crescente ameaça nuclear norte-coreana. Mas Trump, apesar de não se ter mostrado adverso a esta modalidade, decidiu lidar directamente com Kim Jong-un, sem intermediários, e acentuou a tensão entre os EUA e a Coreia do Norte.

O Twitter foi a sua principal arma. Livre de filtros e dos media tradicionais, Trump viu-se livre para ameaçar e provocar Pyongyang. Mas a Coreia do Norte respondeu com exercícios militares cada vez mais sofisticados.

Screenshot via Twitter

2017, o ano em que se pensou que o mundo ia acabar

Em Julho de 2017, Kim Jong-un testou pela primeira vez dois mísseis balísticos intercontinentais (Hwasong-15, ICBM), capazes de atingir os EUA. Em Agosto e Setembro, lançou dois mísseis balísticos intermediários (Hwasong-12, IRBM) sobre o Japão, fazendo soar o alarme nas margens do Mar do Leste. Também em Setembro conduziu o seu sexto teste nuclear, uma bomba de hidrogénio que podia ser acoplada a um ICBM.

A crescente ameaça norte-coreana ditou o anúncio da ordem executiva mais pesada alguma vez aplicada à Coreia do Norte. O teor desta ordem foi, como habitual, fortemente económico. Fortes restrições em matéria comercial a instituições norte-coreanas e a quem com elas tivesse estabelecido relações; proibição de aeronaves ou navios que tenham aterrado e atracado em território norte-coreano de entrarem nos EUA; expansão de sanções dirigidas a indivíduos envolvidos nos sectores da construção, energia, serviços financeiros, pescas e tecnologias da informação, entre outros.

Moon Jae-in, o precursor da nova era

Moon Jae-in, Presidente da Coreia do Sul, foi quem deu uma nova vida à relação entre os três países. Historicamente, os líderes da Coreia do Norte preferem negociar com presidentes liberais. A transição de Governo em 2008, quando Lee Myungbak, de tendência conservadora foi eleito, provocou um retrocesso no processo negocial que tinha verdadeiramente começado com a Sunshine Policy de Kim Daejung.

O regresso de uma política de entendimento sem recurso a mecanismos punitivos promovido por Jae-in satisfez Pyongyang. 2018 foi um ano histórico: Coreias juntas nos Jogos Olímpicos de Inverno, duas cimeiras inter-coreanas, as respetivas declarações (Panmunjeom e Declaração Conjunta de Setembro) e uma cimeira entre os líderes dos EUA e da Coreia do Norte.

Os resultados apareceram rapidamente: a reconstrução de uma ferrovia e estradas de ligação entre as duas Coreias, a desactivação das colunas de propaganda na Zona Desmilitarizada, o desarmamento das tropas na Zona Desmilitarizada, o encerramento de dez postos de vigia da Coreia do Norte, o reencontro de famílias separadas pela Guerra da Coreia, a candidatura conjunta aos Jogos Olímpicos de 2032 e, talvez mais importante embora discreto, nenhum outro teste nuclear ou balístico realizado.

Perante o novo rumo dos acontecimentos, Donald Trump mudou radicalmente o seu discurso e iniciou um novo ciclo na relação com a Coreia do Norte. Partindo de ameaças e mais ameaças ao Little Rocket Man, o novo Trump passou a reconhecê-lo como Chairman Kim, o líder que tornará a economia norte-coreana num rocket.

Screenshot via Twitter

EUA e Coreia do Sul em sintonia pela primeira vez em dez anos

Nos últimos dez anos, EUA e Coreia do Sul abordaram de forma distinta a Coreia do Norte. Obama apostou numa política de strategic patience baseada na diplomacia e na resolução de conflitos através do diálogo. No entanto, negociações só aconteceriam se a Coreia do Norte se comprometesse a iniciar a sua desnuclearização – que não aconteceu.

Do lado sul-coreano, o foco foi a economia. A Policy of Mutual Benefits and Common Prosperity, do presidente Lee Myungbak, pressupunha que a Coreia do Norte deveria iniciar um “caminho rumo ao desenvolvimento”, que seria possível através da abertura do regime (como previsto no programa Vision 3000).

No mandato seguinte, a Trustpolitik, de Park Geunhye, teve como objectivo desenvolver uma relação de confiança entre a comunidade internacional e a Coreia do Norte. Contudo, Park esclareceu ainda antes de se tornar presidente que responderia em conjunto com os EUA a qualquer ameaça norte-coreana. A estratégia da Coreia do Sul resvalou rapidamente.

Trump e Moon juntos, Setembro de 2018 (foto via White House/Flickr)

Em 2018, Moon Jaein e Donald Trump não só estiveram em sintonia, como também apostaram numa política de respeito pela Coreia do Norte, no diálogo e na realização de cimeiras com uma forte carga simbólica – alusiva à reunificação.

A cimeira de Trump e Kim será mais um passo no caminho diplomático que pautou a campanha eleitoral de Moon em 2017. Na Coreia do Sul e nos EUA pedem-se resultados concretos. Este será o verdadeiro teste ao compromisso de Kim Jong-un com a desnuclearização do seu país.

Texto de Nuno Martins

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