No dia 28 de Dezembro de 2018 estreou na Netflix um episódio especial Black Mirror, de seu nome Bandersnatch. Prometia ser um filme e não propriamente mais um episódio. Prometia, ainda, interactividade e poder de escolha ao utilizador, para agir sobre a história. As escolhas começam cedo, pelos cereais que o Stefan Butler vai tomar ao pequeno almoço. E surgem os “BUHH” da malta que esperava escolhas mais significativas. Calma, essas também acontecem, um pouco mais à frente.
Permitam-me que abra aqui um pequeno ( ) sobre escolhas
Há dias, no Twitter, perguntei às pessoas o que escolhiam: arroz carolino ou agulha. É uma escolha simples? Pelos vistos, não. Várias foram as pessoas que responderam “depende do que vais fazer com o arroz” ou “thai” ou “basmati”. Algumas começaram a sugerir pratos, o arroz mais ou menos malandro, o de tomate e até surgiu a opção de risotto. Calma, a escolha é apenas entre dois tipos de arroz, não há razão para complicarmos.
Não parecia haver, mas afinal há. Sobretudo quando temos consciência de que estamos a escolher. Quando pergunto carolino ou agulha? Obrigo-me a escolher entre uma coisa e outra. O exercício que procurei fazer, no Twitter, implicava escolher sem ter em vista o que ia acontecer a seguir (se íamos fazer arroz doce, arroz de tomate ou de coentros) e sem ter outro par para escolher (carne ou peixe, tofu ou seitan).
Escolher é difícil – e isto não é novidade para ninguém, sobretudo quando já tivemos de escolher entre um emprego e outro emprego, entre continuar ou terminar uma relação, entre comprar um livro ou ir ao teatro.
Durante uma hora e meia vemos Stefan a ser sujeito a cenários de escolha. Todos os dias escolhemos. O que tomar ao pequeno almoço? – eis algo com o qual me debato diariamente. Escolher é pesado, é doloroso. Implica deixar algo de parte e ficar só com uma opção. Por este motivo há figuras públicas como Steve Jobs ou Mark Zuckerberg que optam por ter várias peças de vestuário iguais: é menos uma escolha a fazer, no dia-a-dia.
Somos livres? Er…
Espinosa escreve na Ética: “os seres humanos têm a opinião de que são livres” (parte I, apêndice). Mas somos tão livres quanto uma pedra que pensa que escolhe o caminho que percorre, no ar, até ao local onde cai. Existimos e cumprimos um desígnio maior.
Recordam-se do filme Matrix Reloaded? Há um diálogo muito interessante entre o Neo e a Oráculo, no banco do jardim.
Qualquer coisa assim:
(Oráculo) – Senta-te.
(Neo) – Fico de pé.
(Oráculo) – Faça como quiser.
(Neo, depois de se sentar) – Eu sentei-me, porque quis.
(Oráculo) – Eu sei.
Going down the rabbit hole
Bandersnatch é o nome de uma criatura presente no livro Alice do Outro Lado do Espelho, de Lewis Carroll. Curiosamente, tanto no filme Matrix, como em Bandersnatch o coelho tem um papel importante, simbólico, na narrativa.
Podemos admitir: há algo que nos atrai para a toca do coelho. O desconhecido é algo que assusta e atrai, simultaneamente. A curiosidade levou a Alice a perseguir um coelho vestido com um colete, que tinha um bolso, de onde tirava um relógio. A curiosidade levou Neo a optar pelo comprimido vermelho. A curiosidade leva-nos até à Netflix para ter a experiência do filme interactivo. Uns vão querer repetir a experiência, para testar as escolhas. Outros não vão querer repetir. É tudo uma questão de escolher, de fazer uso da nossa liberdade. Ou então não.
Santo Agostinho, Bento de Espinosa e Friedrich Nietzsche
… “entram num bar”. Não, não foi isso que aconteceu. Estes três filósofos visitaram-me enquanto eu via o Bandersnatch. São chamados para este Monólogo Platónico para ajudar a pensar se nós, seres humanos, somos livres. “O ser humano é livre?” – esta foi a pergunta que mais me incomodou durante a experiência Bandersnatch.
O Bruno Figueiredo ajudou-me “a fazer um desenho” para tentar responder a esta pergunta.
E tu? O que é que tu pensas sobre isto? O ser humano é livre? E tal como na pergunta do arroz, não há possibilidade de responder depende ou de introduzir uma terceira hipótese.
Sim ou não?
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