A última geração de iPhones não vendeu como a Apple esperava – nem os dois modelos iPhones XS, nem tão pouco o iPhone mais barato, o XR. Tal situação levou a cortes na produções e defraudou as expectativas dos investidores; Tim Cook, CEO da Apple, foi levado a publicar uma carta dirigida aos investidores, revendo em baixa – pela primeira vez em mais de 15 anos – as previsões da empresa relativas ao último trimestre de 2018. As acções da empresa desvalorizaram mais de 9% num só dia. Cook explicou-se alegando que diversos factores macro-económicos justificavam o cenário mais negativo para a Apple e em particular para o iPhone, nomeadamente o mercado chinês ou o preço mais baixo do programa de substituição de baterias.
Não é propriamente novidade o declínio do iPhone. As vendas dos smartphones da Apple começaram a abrandar em 2015. Todavia, com o aumento dos preços dos equipamento, a empresa tem garantido o crescimento das receitas com este produto. Ainda assim, Tim Cook tem vindo a preparar a empresa para o pós-era dourada do iPhone, apostando no crescimento dos negócio dos serviços – iTunes, Apple Music, iCloud, Apple Care… – e das outras categorias de produto, como o iPad, o Mac, o Apple Watch ou acessórios como os AirPods. A estratégia de Cook tem provado resultar, com os números a subir nestas áreas e com a empresa de Cupertino a alcançar uma valorização de mercado de 1 bilhão em Agosto do ano passado.
Além do seu serviço de streaming de música, a Apple estará a planear lançar uma plataforma de filmes e séries concorrente ao Netflix, cujo lançamento tem sido apontado para o início deste ano. A confirmar-se, será um reforço importante no negócio de serviços da tecnológica, para o qual esta já parece estar a preparar-se. Em Dezembro, numa acção inédita, a Apple tornou o seu Apple Music compatível com as colunas de som da Amazon, as Echo. Até então, o serviço de música só funcionava com as colunas próprias da Apple, o HomePod. No arranque de 2019, outra surpresa da parte da Apple: as séries e filmes do iTunes e o sistema AirPlay vão chegar a um conjunto de televisões Samsung, LG, Vizio e Sony, conforme anunciado por estas fabricantes na CES 2019, feira de tecnologia que está a decorrer esta semana em Las Vegas, nos EUA.
Ao longo dos anos, a Apple tem mantido o seu ecossistema o mais fechado possível nos seus produtos e serviços – o facto de o Apple Watch só funcionar com o iPhone e de este dialogar bem com o Mac ou o iPad, de haver iMessage, Apple Photos, iCloud… contribuiu para as vendas de uns produtos ajudassem as dos outros. Todavia, ao longo do tempo, existiram portas abertas no ecossistema tradicionalmente restricto da Apple. O iTunes, por exemplo, foi lançado para Windows para a Apple captar mais vendas e receitas com os downloads, e porque assim quem tivesse um PC também podia comprar um iPod; o Apple Music está disponível para Android; e o iCloud também pode ser usado no Windows.
Já o AirPlay é uma tecnologia da Apple que permite transmitir vídeo e/ou áudio para uma coluna ou uma televisão. Se no que toca a som já existiam colunas além do HomePod compatíveis com o AirPlay, no que respeita ao vídeo a única solução para fazer streaming de algo de um iPhone ou Mac para o ecrã de uma televisão era através de uma Apple TV. A pequena caixinha da Apple era também a única forma de poder aceder ao catálogo de filmes e séries do iTunes, que funciona em modo videoclube (aluguer de conteúdos isolados), no grande ecrã. Tornar tanto o AirPlay como o iTunes compatíveis com televisões da Samsung e de outras fabricantes é, portanto, um “big deal” – é algo que beneficia os consumidores, mas que não deixa de representar uma jogada interesseira da Apple.
Não se sabe ainda como é que vai ser o “iNetflix” ou “Appleflix”, mas garantidamente quem tiver um iPhone vai poder ver os filmes e séries na sua smart TV Samsung ou LG com o AirPlay – isto se a Apple não lançar uma app dedicada. Certo é que a companhia liderada por Tim Cook tem investido milhões de dólares na produção de conteúdos, bem como na contratação de estrelas, como Oprah Winfrey, Reese Witherspoon, M. Night Shyamalan e Steven Spielberg.
Em suma, a Apple abre o ecossistema quando precisa e como precisa para salvaguardar os seus resultados financeiros; e mantém-o o mais fechado que consegue para garantir a exclusividade do seu ambiente operativo. O iTunes, por exemplo, chega primeiro às televisões do que ao Ubuntu — a versão comum popular do Linux —, para o qual a Apple nunca desenvolveu uma versão da sua aplicação.
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