Julian Assange fundou em 2006 a Wikileaks e, desde então, a sua vida nunca mais foi a mesma. A permanência forçada na embaixada do Equador em Londres é, desde 2012, a única vida a que tem direito e, para além disso ,uma espécie de metáfora para o impasse em que toda a sua acção o deixou.
Desde a criação da Wikileaks que o australiano se empenhou em divulgar informações classificadas de vários governos do mundo e a missão valeu-lhe uma série de atitudes persecutórias despoletadas pelos visados. Sem grandes alegações quanto à informação publicado pela Wikileaks – que expôs desde crimes de guerra do Afeganistão às práticas mais sombrias dos serviços de inteligência dos EUA –, acabou por ser uma acusação de violência sexual vinda da Suécia a confiná-lo ao espaço de asilo.
Da acusação pública da Suécia à acusação secreta dos EUA
A queixa vinda do país nórdico fora sempre negada pelo australiano e, em 2017, foi mesmo retirada pelas autoridades suecas; apesar disso, a pressão sobre Assange não diminuiu com as autoridades britânicas a deixarem desde logo claro que mesmo depois de arquivada esta queixa continuariam a ter motivos para o prender caso saísse da Embaixada.
Para Assange, o cenário era claro, embora as suas intenções não fossem publicamente expostas: a ideia seria prendê-lo na Europa para que pudesse extraditado para os Estados Unidos, onde viria a ser acusado pela divulgação de documentos políticos e militares altamente confidenciais.
Um ano passou-se e, entretanto, pouco ou nada se falou de Assange. Desde as últimas presidenciais norte-americanas, nas quais Clinton afirmou que a Wikileaks tinha sido uma das causas da sua perda eleitoral, que o assunto passou para segundo plano, pelo menos no que toca a cobertura mediática. Isto porque, segundo noticia o Washington Post (WP), atrás das câmaras as acções continuam.
Num artigo publicado no dia 15 de Novembro, o WP dá conta de que Julian Assange estará mesmo a ser acusado em segredo e que tudo terá sido revelado por engano, numa menção escrita feita num documento referente a um outro caso sob a alçada do mesmo procurador, Kellen S. Dwyer. A descoberta terá sido feita por Seamus Hughes, um professor universitário, que partilhou essa informação no Twitter, lançando o debate e a corrida à verificação.
https://twitter.com/SeamusHughes/status/1063232297674162176
SCOOP: US Department of Justice "accidentally" reveals existence of sealed charges (or a draft for them) against WikiLeaks' publisher Julian Assange in apparent cut-and-paste error in an unrelated case also at the Eastern District of Virginia. https://t.co/wrjlAbXk5Z pic.twitter.com/4UlB0c1SAX
— WikiLeaks (@wikileaks) November 16, 2018
Segundo as fontes ouvidas pelo Washington Post, confirma-se que, de facto, não existia qualquer relação entre o documento onde surge a menção a Assange e o seu caso mas confirma-se também os trabalhos para a formalização da acusação contra Julian Assange. Conforme se lê no equívoco, a acusação só seria tornada publica quando Assange fosse detido.
A possibilidade de os EUA acusarem Julian Assange não é nova e ganhou força com as investigações sobre as eleições de 2016 e as alegadas ligações entre o Wikileaks e documentos obtidos por hackers russos. A despoletar esta nova linha de investigação estará um e-mail de um dos principais conselheiros de Trump, Roger Stone, para Steve Bannon, em que notava conhecer os planos da Wikileaks e mais concretamente de Julian Assange para a publicação de e-mails. A hipótese já teria sido avançada pelo Wall Street Journal.
“Não podes apoiar a acusação de um editor por publicar”
A acusação não é propriamente surpreendente, mas o modo de operacionalização da justiça não deixa de ser surpreendente, com o acusado a saber apenas por erro e acaso que o seu processo já dera entrada. O caso está a fazer correr muita tinta por vários jornais internacionais, ecoando uma preocupação que Edward Snowden:
You can despise Wikileaks and everything it stands for. You can think Assange is an evil spirit reanimated by Putin himself. But you cannot support the prosecution of a publisher for publishing without narrowing the basic rights every newspaper relies on. https://t.co/Hs5XH6Vmzz
— Edward Snowden (@Snowden) November 16, 2018
“Podes desprezar o Wikileaks e tudo aquilo que eles representam. Até podes pensar que o Assange é um espírito do mal reanimado pelo próprio Putin. Mas não podes apoiar a acusação de um editor por publicar sem restringir os direitos básicos de que todo jornal depende.”
– Edward Snowden, Twitter
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