“A Covid-19 vai mudar as nossas cidades?” Não, diz Norman Foster

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Cúpula do Reichstag, Berlim - edifício projectado por Norman Foster. Foto de: Tim Gage

“A Covid-19 vai mudar as nossas cidades?” Não, diz Norman Foster

Normam Foster falou do alto dos seus 85 anos para assegurar, de certa forma, que o futuro não será com certeza com 2 metros de distância entre indivíduos. Para isso, lembrou que a pandemia de Influenza entre 1918-20 foi muito mais mortal, também teve uma resposta sanitária forte, com confinamentos, quarentenas e o uso aconselhado de máscara mas acabou por resultar na revolução social e cultural dos anos 1920.

Norman Foster, arquitecto influente de 85 anos, sócio da Foster+Partners, e responsável pelo desenho de edifícios importantes um pouco por todo o mundo, como o 30 St Mary Axe em Londres, o Estádio de Wembley ou a renovação do Reichstag em Berlim, foi um dos oradores convidados a abrir o chamado Forum of Mayors 2020 das Nações Unidas. No evento que reúne responsáveis municipais de diversas cidades do mundo, o arquitecto partilhou a sua opinião sobre o potencial de mudança que uma pandemia como a Covid-19 pode trazer ao mundo e, concretamente, às cidades.

Foster começou por dizer que, na sua opinião, numa visão histórica sobre o que é uma cidade, a mudança trazida pela pandemia de Covid será praticamente nula. O arquitecto não prevê mudanças de fundo na forma como se pensa a cidade, mas corrobora a ideia de que a pandemia veio acelerar tendências que já eram emergentes. Num discurso endereçado aos responsáveis municipais, que Foster fez questão de apelidar de “tributo” ao trabalho de liderança que muitos fazem na ausência de proximidade dos líderes nacionais, o arquitecto inglês lembrou que nas últimas décadas a única constante nas cidades é a da mudança, conduzida por aqueles que têm visão para aplicar as tecnologias dos tempos modernos.

Norman Foster falou do alto dos seus 85 anos para assegurar, de certa forma, que o futuro não será com certeza com 2 metros de distância entre indivíduos. Para isso, lembrou que a pandemia de Influenza entre 1918-20 foi muito mais mortal, também teve uma resposta sanitária forte, com confinamentos, quarentenas e o uso aconselhado de máscara mas acabou por resultar na revolução social e cultural dos anos 1920.

Em 2020, Norman Foster, num exercício de futurologia assente na sua experiência, estima que as grandes mudanças desta pandemia ocorrerão sobretudo ao nível da mobilidade, de pessoas, bens e informação, que, na sua opinião, tem de ser convergente com o projecto de descarbonização e luta às alterações climáticas. Nesse sentido, Foster antecipa que as cidades no pós-pandemia possam acelerar as mudanças tornando-se mais verdes e, essencialmente, replicando os bons exemplos que aqui e ali já se foram materializando.  Por exemplo: a tendência para veículos eléctricos sem combustíveis fósseis, o desinteresse dos jovens na propriedade, as novas formas de partilha de deslocações, o crescimento das bicicletas e das scooters, o uso de drones para entregas e a diminuição do espaço para veículos.

Num exemplo concreto, o arquitecto sugere que os edifícios mais ecológicos, com ventilação natural, que eram até aqui uma excepção poderão passar a ser o mais comum, traduzindo uma tendência global para seguir a prova dada pela ciência de que os espaços verdes e a proximidade com os elementos naturais melhora a condição de vida dos cidadãos. Nesse sentido, Foster vê este momento como um catalisador para as mudanças provocadas por décadas de estudos e progressos um pouco por todo o mundo, dando o exemplo da “Cidade dos 15-minutos” e do ressurgimento deste apelo em plena pandemia. Assim, industrialmente e culturalmente, o arquitecto sugere que algumas tendências podem ganhar, ou voltar a ganhar, relevância, nomeadamente: o foco na desigualdade entre o global e o local, uma aposta na manufactura local menos poluente e que revigore o tecido económico, o incentivo à criação de espaços culturais e artísticos, bem como, a proliferação de hortas urbanas recorrendo a novas técnicas de cultura para aproximar a comida da porta de nossas casas.

Assim, o arquitecto imagina que no futuro as cidades não serão estruturalmente diferentes, mas a vivência dentro delas pode ser, à medida que o acumular de mudanças torna as cidades mais calmas, limpas, seguras, saudáveis, amigáveis, cicláveis e caminháveis. A “Cidade dos 15 Minutos”, famosa concepção promovida por Anna Hidalgo em Paris, estipula que todos os cidadãos tenham tudo o que precisam para viver o seu quotidiano a menos de 15 minutos a pé do seu local de habitação, reduzindo a necessidade de transportes motorizados e longas deslocações. Na ausência dessas deslocalizações, e do espaço necessário à circulação, Foster acredita que podem surgir mais espaços verdes que retro-alimentem esta lógica de fruição do espaço citadino.

No discurso obviamente pautado por um elogio à visão de alguns líderes, o arquitecto sublinhou ainda as aprendizagens que o vírus permitiu, nomeadamente no que toca a densidade habitacional. Nesse capítulo Foster destacou, mais uma vez, que a pandemia apenas reforçou o que já existia, fazendo soar os alarmes para as fracas condições de habitabilidade nos subúrbios e para os sem-abrigos, população especial vulnerável e muitas vezes sem condições de cumprimento das regras de saúde pública.

“A pandemia é um evento trágico para muitos, todos perdemos entes queridos e no momento o vírus continua. Mas dando um passo atrás, estou confiante de que as cidades vão provar a sua resiliência e apelo – vão voltar mais fortes e melhores como consequência.” disse em jeito de balanço final.

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