Entre a literatura e a computação: uma entrevista sobre Literatura Electrónica

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Entre a literatura e a computação: uma entrevista sobre Literatura Electrónica

Falámos com Rui Torres, um dos destacados nomes da investigação e prática de Literatura Electrónica em Portugal, em jeito de antecipação da conversa ao vivo, que vai decorrer nesta quinta-feira, 13 de Outubro, no Goethe-Institut Lisboa.
Esta entrevista é publicada em parceria com o Goethe-Institut Portugal no âmbito do ciclo “AUTOMAT: Literatura e Inteligência Artificial”. Nesta quinta-feira, 13 de Outubro, terá lugar a conversa Script ou Escrita: Inteligência Artificial e Poesia Digital com Rui Torres, pioneiro da literatura electrónica, e moderação de João Gabriel Ribeiro. O encontro arrancará às 19 horas no Goethe-Institut Lisboa, com entrada livre.

Ao longo de toda a história da Humanidade, a relação entre humanos e máquinas foi sempre transformadora de toda a sua envolvente. À medida que o tempo passa, a tecnologia se desenvolve e as máquinas se sofisticam – até se tornarem discretamente parte do nosso quotidiano –, essa percepção pode tornar-se cada vez mais dissoluta mas nem por isso a transformação é menos evidente.

Em coisas tão simples como este artigo, a presença e intermediação das máquinas, num sentido lato, modela todo o seu ciclo de vida e transforma todo o processo. As tipografias foram substituídas pelos computadores, a impressão pelo botão ‘publicar’ e o quiosque de venda pelo algoritmo, mas nem todas estas mudanças foram consentidas de um modo crítico. As máquinas mudam, nós mudamos com elas, mas nem sempre conscientes da ambivalência desta relação.

Onde se situa a mudança, que caminho estamos seguir e qual será o culminar desta evolução, são mais do que perguntas passíveis de ser respondidas, um campo de experimentação e descoberta indispensável a entendermos o mundo em que vivemos – que inevitavelmente inspira as mais diversas abordagens artísticas.

É entre estas práticas que podemos situar Literatura Electrónica. Uma iteração, como outras, da literatura, em que se faz da exploração da relação entre humanos e máquinas um campo de prática e expressão criativa. Gerando textos com algoritmos, valendo-se da interactividade da internet, da forma como código esconde possibilidades iminentes de serem impressas ou a inteligência artificial gera resultados imprevisíveis, a literatura electrónica funde o computação e literatura, proporcionando uma relação crítica com ambas.

Rui Torres, natural do Porto, professor catedrático na Universidade Fernando Pessoa e membro do Conselho Administrativo da Electronic Literature Organization, é um dos destacados nomes do pensamento sobre esta disciplina, e um interlocutor de excelência para um diálogo exploratório deste universo. Numa entrevista por e-mail, antecipando a conversa Script ou Escrita: Inteligência Artificial e Poesia Digital, que vai decorrer esta quinta-feira, 13 de Outubro, ao final do dia, no Goethe-Institut Lisboa, explica-nos o que distingue a Literatura Electrónica, como chegou até este domínio, e a importância do contacto do público com esta disciplina para uma maior literacia tecnológica e mediática.

Essa “paixão” pela literatura eletrónica resulta da possibilidade de estudar um fenómeno através da sua criação/experimentação: uma investigação criativa.

Nas suas palavras, qual seria a melhor forma de definir a Literatura Electrónica? O que a torna uma categoria à parte?

A literatura eletrónica é, antes de tudo, literatura. Não uma literatura à parte, mas uma literatura do seu tempo, que reconhece o papel das mediações e das linguagens digitais na produção e receção do literário. Os autores de literatura eletrónica adotam, de um modo criativo, a(s) tecnologia(s) do seu tempo, situando-se no território da experimentação e da investigação, avaliando as possibilidades e os constrangimentos das plataformas e dos programas, refletindo acerca dos modos como estes afetam a escrita e a leitura. A literatura eletrónica promove por isso uma fusão entre duas camadas: uma camada computacional e uma camada literária. A Electronic Literature Organization oferece uma definição ampla: “obras com importantes aspetos literários que aproveitam as capacidades e contextos fornecidos pelo computador pessoal ou em rede”. Recentemente, no quarto volume da Electronic Literature Collection, do qual fui um dos editores, propusemos que uma obra de literatura eletrónica incorpora pelo menos três aspetos: qualidades literárias co-produzidas por interação humana e algorítmica; inovação formal e/ou conceitual; e uma experiência transformadora para os leitores por meio de algoritmos expressivos (https://collection.eliterature.org/4/about). Tal como propuseram vários outros autores antes de nós (Pedro Barbosa, Loss Glazier, Jorge Luiz Antonio, Chris Funkhouser, Katherine Hayles, Scott Rettberg, Leo Flores, Manuel Portela, entre tantos outros, publicaram monografias dedicadas ao assunto), é a simbiose expressiva entre humano e máquina que melhor ajuda a compreender a literatura eletrónica. Esta dimensão cooperativa e dialogante é o que me tem interessado: utilizar o computador como um “telescópio de complexidade” ou como “máquina semiótica”, como propôs Pedro Barbosa.

O Rui Torres é artista e professor, tendo começado o seu interesse pela área da Literatura Electrónica por volta de 1998, segundo li numa outra entrevista. Como chegou ao conhecimento desta área da literatura e como desenvolveu essa paixão?

Consegui chegar à poesia concreta e à música experimental (outras paixões que me acompanham) de uma forma mais ou menos independente, mas no caso da literatura eletrónica não o teria conseguido sem a ajuda do Pedro Barbosa, de quem fui aluno, nos anos noventa, portanto vinte anos depois das suas experiências pioneiras com texto automático no LACA da Universidade do Porto. Essa aventura, que ele designou inicialmente como literatura cibernética, era pouco conhecida e quase não circulava, embora tivesse sido publicada em dois volumes, pela Afrontamento. Como Barbosa admite, tratou-se de “uma aventura no deserto”, partindo “do nada”, como um “aprendiz de feiticeiro”. Pedro Barbosa criou o CETIC – Centro de Estudos sobre Texto Informático e Ciberliteratura na Universidade Fernando Pessoa em 1996. Entre as várias atividades dinamizadas pelo centro figura uma visita ao Porto pelo Philippe Bootz, autor francês de poesia animada por computador. Esse encontro foi muito significativo para mim, porque me deu a conhecer, ao vivo, os vários números da revista eletrónica Alire (que publicou, em disquete, obras de literatura eletrónica do próprio Bootz, além de outras de Tibor Papp, Jim Andrews, Reiner Strasser, Annie Abrahams, Pedro Barbosa, Jacques Donguy e Eduardo Kac, entre outros). Entretanto, decidi estudar e fazer a transição de século nos Estados Unidos, mas sempre mantive contacto com as atividades do CETIC. Nessa altura, iniciei um conjunto de experiências com poesia animada por computador, primeiro, e com motores textuais, depois. Trabalhei, durante esse período, principalmente, com o software Flash. Durante esse período, o Pedro Barbosa desenvolveu na UFP/CETIC o Sintext-Web, com o engenheiro José Manuel Torres, publicado no CD-ROM “O Motor Textual” em 2001. Essa versão Java, para “funcionar” (na altura) na web, atualizava o programa Sintext, criado em 1993 por Barbosa em colaboração com o engenheiro Abílio Cavalheiro (em C++), o qual, por sua vez, atualizava (para correr em disquete, que também funcionava, na altura!) programas anteriores escritos em FORTRAN e em BASIC. Quando regressei a Portugal, vim dar aulas para a UFP e passei a trabalhar no estudo e disseminação do trabalho dos poetas experimentais em geral, e da obra do Pedro Barbosa em particular. Organizei traduções, digitalizações, emulações, recriações e releituras. Foi no âmbito dessas atividades de criação (como “artista” ou poeta) e de disseminação (como “professor” ou investigador) que fui encontrando os meus pares. A comunidade da literatura eletrónica surgiu a partir de encontros que integravam conferências científicas, exposições e festivais. No meu caso, primeiro foi o Brasil (São Paulo, Belo Horizonte, Santa Catarina), depois Espanha (Santiago de Compostela, Barcelona, Madrid, Granada) e, mais recentemente, os Estados Unidos (várias Universidades) e a Noruega (Bergen). Resumindo, essa “paixão” pela literatura eletrónica resulta da possibilidade de estudar um fenómeno através da sua criação/experimentação: uma investigação criativa.

Como a literatura eletrónica é inerentemente interdisciplinar (resultando do diálogo entre camadas culturais e camadas computacionais que referi anteriormente), ela acaba por ser recebida com alguma desconfiança e interpretada com bastante dificuldade.

Diz-se muitas vezes que Portugal é um país de poetas. Como se relaciona essa tradição com a literatura electrónica? Sei que Herberto Hélder, por exemplo, poderá ter sido um dos precursores da literatura electrónica – há outros cruzamentos entre estes universos?

Ana Hatherly, ao recensear obras de Pedro Barbosa na revista Colóquio Letras (1978, 1983), faz referência a um processo de “transposição” da “máquina electrónica” para o humano, demonstrando que certos exercícios de desconstrução levados a cabo pelos experimentalistas portugueses (Helder, Aragão, Melo e Castro, ela própria) simularam os processos combinatórios e generativos da ciberliteratura. Helder conhecia, efetivamente, as experiências com texto automático dos italianos, principalmente de Nanni Balestrini, no início dos anos 60. É interessante que Pedro Barbosa tenha usado alguns desses textos de Helder e outros de Melo e Castro como base das suas experiências com o Sintext. E não deixa de ser curioso também que o próprio Balestrini, anos antes da sua morte e meio século depois das experiências “manuais” de Helder, tenha “programado” textos do Herberto Helder. Isto é, os procedimentos combinatórios e aleatórios não-computacionais antecipam (e preparam) a poesia digital, mas podemos recuar ainda mais, por exemplo ao Barroco (e aos seus labirintos, anagramas e textos visuais, recuperados e estudados pela Ana Hatherly), para encontrar outros antecedentes da literatura eletrónica. O próprio Helder invoca o paralelismo medieval e as cantigas dos cancioneiros na introdução do seu livro “Electronicolírica”. Além destas histórias (talvez estórias), que estão associadas à génese da poesia experimental em Portugal, por influência direta das viagens de António Aragão a Itália, há também um relato, por Fernando Namora (no livro “Diálogo em Setembro”, de 1967), sobre os Encontros Internacionais de Genebra (“O Robot, o Animal e o Homem”, 1965), que apresentaram em Portugal as experiências de Louis Couffignal com poesia gerada por computador. Pedro Barbosa retoma esta crónica de Namora no primeiro volume de “A Literatura Cibernética” (1977), referindo-se ao “alarme” despertado pelo “mito do robô-poeta”. Esta discussão acerca do texto artificial, por Namora e depois por Barbosa, antecipa, em quase cinquenta anos, debates recentes acerca da inteligência artificial.

Como tem vindo a evoluir esta prática no nosso país? Há circuitos e comunidades interessadas e participativas no seu desenvolvimento?

Há que entender que estou a tentar restringir-me à literatura eletrónica, e não a toda a arte computacional. Artistas como Leonel Moura, Marta de Menezes e André Sier têm realizado um trabalho muito significativo que cruza arte e tecnologia. Por vezes, as suas obras atravessam a “poesia” de um modo expressivo. Mas na relação com a literatura, além das experiências iniciais de Barbosa, há um conjunto variado de autores que trabalharam com aspetos da poesia digital: Silvestre Pestana, Ernesto de Melo e Castro, Antero de Alda, e, eventualmente, Abílio-José Santos e César Figueiredo. A obra de Silvestre Pestana é a esse nível bastante eloquente: nos últimos cinquenta anos, adotando meios diversos (do vídeo ao néon) e plataformas variadas (do ZX Spectrum ao Second Life), tem transferido a poesia para contextos expositivos híbridos (museus, galerias), frequentemente combinados com a performance e a instalação. Um pouco imune a esta narrativa académica que estou aqui a manifestar, Pestana foi criando a sua própria linguagem e formas alternativas de circulação da mesma. No entanto, se assumir a perspetiva de um investigador, como eu também sou, devo reconhecer o papel de algumas instituições que ajudaram a consolidar comunidades de prática. A Universidade Fernando Pessoa, por exemplo, sempre ofereceu as condições, o alento e o apoio para investigação em ciberliteratura, desde o tempo do CETIC até projetos recentes que permitiram desenvolver o Arquivo Digital da PO.EX. A Universidade Nova de Lisboa (onde Pedro Barbosa apresentou uma tese de doutoramento que tinha como primeiro tomo a sua teoria da ciberliteratura), através, principalmente, dos professores José Augusto Mourão (RIP) e Maria Augusta Babo, ocasionou a criação de projetos muito interessantes realizados num Atelier de e-Textualidade, entre 2007 e 2013. Desde 2010, o curso de doutoramento em Materialidades da Literatura, na Universidade de Coimbra, coordenado pelo professor Manuel Portela, um dos mais destacados teóricos da literatura eletrónica, passa a desempenhar um papel destacado no ensino, estudo e divulgação da literatura eletrónica. No contexto das atividades das MatLit, além de teses, conferências e publicações, foi criado o MATLIT LAB: Laboratório de Humanidades que pode vir a ter um papel importante na formação de leitores e criadores de literatura eletrónica.

Numa entrevista a um net-artist francês, Raphael Bastide dizia-me que a net-art, apesar de ser muito acessível, nem sempre é reconhecida como tal. No caso da literatura electrónica, acha que acontece o mesmo? Falta algum reconhecimento por divergir do estereótipo do que é um texto, um poema, o que seja?

Talvez o sonho da unidade do conhecimento tenha falhado. Embora a “interdisciplinaridade” ainda surja como chavão, os ciclos de estudos e os projetos de I&D ainda estão constrangidos pela especialização (departamentos, faculdades, áreas científicas, etc.). Ora, como a literatura eletrónica é inerentemente interdisciplinar (resultando do diálogo entre camadas culturais e camadas computacionais que referi anteriormente), ela acaba por ser recebida com alguma desconfiança e interpretada com bastante dificuldade. Para mim, isso é prova do seu potencial didático, como ferramenta que nos pode auxiliar na construção de uma pedagogia interdisciplinar que promove, conjuntamente, a literacia digital. Assim vista (como dispositivo crítico e instrumento educacional), a literatura eletrónica não precisa de se tornar uma forma soberana de expressão (acessível, visível, lucrativa). A literatura eletrónica implica um projeto onde convergem a reflexão e investigação das condições de produção e circulação dos textos nos média eletrónicos e digitais.

A literatura eletrónica envolve criticamente os leitores com a materialidade dos média, motivando uma consciência acerca da nossa ecologia mediática.

Faz parte do painel de directores da Electronic Literature Organization. Quer explicar-nos o papel desta organização? E o seu papel?

A ELO é uma organização internacional dedicada à investigação da literatura produzida em meio digital que foi fundada em Chicago em 1999 (um pouco depois, portanto, do CETIC, já referido). Inicialmente presente principalmente na América do Norte, hoje em dia está representada na América do Sul, na Europa, Ásia, Austrália e África. Os membros da ELO trabalham em áreas de estudo muito variadas: arte e literatura, comunicação e média, computação e informática, etc. Organizamos anualmente uma conferência (sempre associada a exposições e performances); temos uma parceria com a Bloomsbury Academic, através da qual editamos uma coleção de livros intitulada “Electronic Literature”; publicamos uma antologia de cinco em cinco anos, a Electronic Literature Collection; mantemos atualizada uma base de dados: o Electronic Literature Directory; supervisionamos arquivos digitais de várias comunidades. Faço parte do Board of Directors da ELO desde 2014, fui secretário entre 2019 e 2022, sou atualmente o tesoureiro, e organizei uma conferência (ELO2017) e uma coleção (ELC4), além de que sou co-editor da coleção da Bloomsbury e tenho trabalhado com outros diretores na continuidade do CELL – Consortium on Electronic Literature, uma iniciativa que tem como objetivo estabelecer comunicação cooperativa (interoperabilidade) entre bases de dados dedicadas à literatura eletrónica mundial.

É importante para além da exposição, conversas como a agendada para o Goethe Institut para através da demonstração aproximar o público da literatura electrónica?

Tudo isto é muito importante. E há que reconhecer o esforço que deve ser feito por professores do ensino básico e secundário, também. As atividades dinamizadas por um grupo de investigadores da Universidade de Coimbra, liderado pela professora Ana Maria Machado e pela investigadora Ana Albuquerque e Aguilar, têm criado, em articulação com o Plano Nacional de Leitura 2027, um contexto que poderá ser adotado em sala de aula. O PNL27 já inclui, na sua área de Recursos, uma secção de “Audiolivros e APPS” onde figuram a obra “Inanimate Alice”, obras do coletivo wr3ad1ng d1g1t5, poesia combinatória, e livros de realidade aumentada. É ainda pouco, mas é muito importante. E há interesse efetivo, por parte de alunos e professores. Posso testemunhar, a título pessoal, várias visitas a escolas, onde organizei aulas abertas e exposições; mas também em livrarias e bibliotecas. As ações de formação na área da escrita criativa digital são outra forma de aproximar os públicos da literatura eletrónica.

“Mas há que reconhecer que toda a arte é, de certa forma, experimental, já que ela promove, no acto da sua construção, uma relação de deformação do real, de actuação com o espaço e o tempo humanos”, diz numa entrevista. Em que medida pode o contacto com este tipo de arte promover uma compreensão crítica das interfaces que nos rodeiam, aumentando assim a literacia digital?

A literatura eletrónica envolve criticamente os leitores com a materialidade dos média, motivando uma consciência acerca da nossa ecologia mediática. Baseada na investigação e na experimentação, ela esforça-se por tornar os média eletrónicos visíveis e compreensíveis, expondo e desmontando as interfaces que, como bem refere, nos envolvem. Para isso, porém, julgo que a literatura eletrónica não deve operar em cumplicidade com os média existentes, adaptando-se às plataformas existentes no mercado. Pelo contrário, deve resistir aos discursos dominantes, ou até romper com eles.

Numa altura em que vivemos uma espécie de digitalização em massa das sociedades contemporâneas, acredita que a literatura cibernética pode inspirar uma nova ecologia digital? Um novo conjunto de valores e prioridades inspirada em questões que vão desde a política de software às práticas de arquivo e exibição?

De facto, os novos média digitais prometeram (e concretizaram) uma rotura com modelos de organização e apresentação do conhecimento. Kate Hayles falou sobre uma “nova forma de textualidade”. Houve, por isso, uma transformação nas práticas que refere. No entanto, a tecnologia amplia a criatividade humana, mas também a sua vulnerabilidade. No que diz respeito aos ecossistemas, por exemplo, é inegável que os avanços tecnológicos têm contribuído para colocar em risco a relação do humano com a natureza. E muitas obras de literatura eletrónica atual têm promovido precisamente essa reflexão. Além dessa batalha, devemos talvez garantir que nos empenhamos em resistir a uma ignorância em relação às condições materiais da escrita que o aparato tecnológico sempre promove.

O seu lugar de professor permite-lhe, de certa forma, espreitar um futuro próximo entre os alunos que passam pelas suas turmas. Como vê a evolução da literatura electrónica, em Portugal e lá fora?

O último volume da Electronic Literature Collection (2022), já por mim referido, recebeu aproximadamente 450 submissões de obras de grande qualidade. Dentre essas, publicámos 132 obras em 31 línguas. Estas obras envolvem uma enorme variedade de géneros, plataformas, meios, linguagens e formatos, evidenciando um campo vibrante e em renovação e expansão. A coleção inclui experiências com realidade virtual, videojogos narrativos, trabalhos em diálogo com Inteligência Artificial, narrativas geoespaciais, etc. Além disso, no que diz respeito a Portugal, a ELC4 publica seis obras de autores portugueses: o coletivo wr3ad1ng d1g1t5, Bruno Ministro, Liliana Vasques, Antero de Alda, Daniela Maduro e Álvaro Seiça. Isto parece-me muito importante, já que nos três volumes anteriores da ELC tinham sido publicados apenas três autores (eu próprio, no volume 2; e Pedro Barbosa e António Abernu, no terceiro volume).


No segundo debate do ciclo de eventos “AUTOMAT: Literatura e Inteligência Artificial”, que terá lugar a 13 de Outubro, o jornalista João Gabriel Ribeiro (Shifter) falará com Rui Torres, um dos pioneiros da poesia digital em Portugal, sobre a interação entre inteligência artificial e literatura. Uma conversa sobre literatura na rede e literatura como rede, autoria colaborativa e o futuro da escrita – e com a criação ao vivo de um poema digital, baseado nos “Faustos” de Goethe e de Pessoa. A sessão terá início às 19h na biblioteca do Goethe-Institut Lisboa e terá transmissão em streaming no Facebook. Sabe mais aqui.

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  • João Gabriel Ribeiro

    O João Gabriel Ribeiro é Co-Fundador e Director do Shifter. Assume-se como auto-didacta obsessivo e procura as raízes de outros temas de interesse como design, tecnologia e novos media.

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