A luta contra o aquecimento global morreu na praia e valeu ouro à Lituânia

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A luta contra o aquecimento global morreu na praia e valeu ouro à Lituânia

A democracia precisa de quem pare para pensar.

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Poucas peças traduzem e sintetizem tão bem o espírito dominante como a do Pavilhão da Lituânia na Bienal de Veneza.

Se há tema urgente de debater em qualquer disciplina, esse tema é o do aquecimento global; contudo, nem sempre a urgência do debate e da exploração intelectual conduz a grandes resultados por si só. No mundo da arte contemporânea, de que aqui se fala, o caso é especialmente bicudo. Habituados a partir de planos mais abstratos e conceptuais e sem uma tendência para responder com obras aos momentos sociais, a classe artística tem feito algumas peças de reflexão sobre o tema mas poucas tocam no cerne da questão.

Obras como a que recentemente esteve no MAAT, Overflow, de Tadashi Kawamata trazem para o plano central de exposição as consequências e deixam-nos mais alerta mas poucas peças traduzem e sintetizem tão bem o espírito dominante nesta área como o pavilhão da Lituânia para a Bienal de Veneza.

Lina Lapelyte, Vaiva Grainyte e Rugile Barzdziukaite criaram Sun & Sea; as três artistas lituanas escolheram um pavilhão deslocado da zona de exposição e deram-lhe uma nova vida, transformado-o numa praia; do varandim podem contemplar-se as pessoas, deitadas na areia e como se estivessem ao sol, entretidas nos seus smartphones ou noutras actividades típicas de praia, enquanto que das colunas surgem sons de gaivotas e carrinhas de gelados.

Em vez de optar pelo tom de alarme, as artistas lituanas, uma directora de teatro, uma dramaturga e uma compositora, optaram pela abordagem romântica das coisas e trouxeram para a reflexão o nada; enquanto estão praia improvisada, os performers são convidados a cantar músicas do seu dia-a-dia e é esse contraste entre a banalidade das queixas contidas nas músicas e a indiferença representada por cada corpo deitado no areal que dá densidade à reflexão. Em entrevista à revista de arte artnet, uma das artistas, Vaiva Grainyte, explica que a sua peça é sobre o Antropoceno e a crise ecológica, lembrando que as crises mundiais se desenrolam “facilmente, suavemente, como uma música de pop contemporânea”.

Como sugere a reflexão da artnet, é bem provável que seja assim o desfecho da Humanidade; não com um estrondo explosivo que nos tolha a todos, mas com uma preguiça e uma auto-resignação que nos torne indiferentes às maiores calamidades e nos faça simplesmente ir curtir para a praia mesmo que seja o calor do momento final.

De resto, a peça foi tão bem recebida que acabou por ser distinguida com o mais alto prémio da bienal, o Ouro.

As artistas Lina Lapelyte, Vaiva Grainyte e Rugile Barzdziukaite

A exposição está patente até ao dia 31 de Outubro e qualquer pessoa pode não só visitá-la como participar. As artistas em conjunto com a organização convidam quem quiser juntar-se a registar-se através de um formulário para participar de uma das sessões já agendadas. Podes encontrar mais informação aqui. Para além disso, para que a peça dure até ao final da Bienal, é preciso contratar figurantes e tratar da manutenção pelo que se quiseres ajudar também podes ajudar através do Indiegogo.

Fotos de Andrej Vasilenko, disponibilizadas pelas artistas

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  • João Gabriel Ribeiro

    O João Gabriel Ribeiro é Co-Fundador e Director do Shifter. Assume-se como auto-didacta obsessivo e procura as raízes de outros temas de interesse como design, tecnologia e novos media.

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