Rubrica de futurologia da EuroTeam, edição de 15 de Dezembro. Guardem este texto para nos mostrarem quão errados estávamos.
As eleições europeias de 2019 acontecerão de 23 a 26 de maio, aproximadamente daqui a 5 meses. Em Ciência Política, um intervalo dessa amplitude é geralmente apodado de “uma carrada de tempo”. É inescapável: no dia em que escrevemos ainda não se conhecem cabeças-de-lista nacionais, (todos os) candidatos a presidente da Comissão Europeia (escolha em que, pelo método do spitzenkandidat, o Parlamento tem poder de veto) ou (todas as) sondagens especificamente para estas eleições. É cedo; os partidos ainda estão a sentir o terreno, atentos aos desenvolvimentos do processo “Brexit”, e, no geral, demasiado embrenhados em problemas internos. No entanto, começar um Guia para as Eleições Europeias implica olhar para o futuro e perceber onde estamos antes de a campanha arrancar.
Para fazermos isso, vamos às sondagens. Como dissemos, não há ainda muitas. Dos países mais relevantes, pelo número de eurodeputados que elegem, já tivemos notícias de Itália e de França que não são brilhantes para o futuro da União, já que os partidos que reúnem mais intenções de voto são eurocéticos/europonentes. Numa análise de maior âmbito, podemos fazer uso do utilíssimo Poll of Polls (PoP) , que agrega sondagens dos vários Estados-Membros e constrói um modelo à escala europeia. Devemos, no entanto, fazer uma reserva: em muitos países não existem ainda sondagens sobre as eleições europeias, o que força o Poll of Polls a agregar resultados de meros barómetros eleitorais dos partidos nacionais.
Num Parlamento Europeu sem o Reino Unido sentar-se-ão 705 representantes, o que leva a que qualquer maioria exija 353 deputados. A maioria é importante não só para a aprovação de legislação como para o processo de seleção da futura Comissão Europeia e, em particular, do seu Presidente — pelo processo do spitzenkandidat.
Neste momento (16/12, 12h), o método do PoP aponta para a seguinte representação parlamentar:
- 184 deputados para o Partido Popular Europeu (que compara com os 221 eleitos em 2014);
- 131 para a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (191 eleitos em 2014);
- 99 para a Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa (67);
- 64 para a Europa das Nações e da Liberdade (inexistente à data da última eleição);
- 53 para o Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde (52);
- 47 para os Conservadores e Reformistas Europeus (70);
- 46 para os Verdes/Aliança Livre Europeia (50)
- 45 para a Europa da Liberdade e da Democracia Direta (47).
(futuramente lançaremos um tema sobre os vários partidos, já que, por exemplo, embora Europa da Liberdade e da Democracia Direta soe inclusivo, é nesse partido que se reúnem os partidos de extrema-direita)
Anterior (resultados de 2014) | Atual (resultados previstos) | |
PPE | 221 | 184 |
S&D | 191 | 131 |
ALDE | 67 | 99 |
ENL | – | 64 |
GUE/NGL | 52 | 53 |
ECR | 70 | 49 |
G/EFA | 50 | 46 |
EFDD | 47 | 45 |
TOTAL | 751 | 705 |
Nota: como o total de deputados é menor, há partidos que, tendo menos deputados previstos, têm maior proporção de representantes. Notar também que faltam os deputados não-inscritos
O que nos dizem as previsões é que os grupos tradicionalmente mais fortes (e tendencialmente defensores da manutenção da integração europeia) perderão influência. O Brexit, ainda por acontecer, tem já impacto na composição do Parlamento Europeu, já que o RU era uma fonte de deputados desses grupos tradicionalmente mais fortes (nomeadamente o ECR e o S&D). A abstenção, que esteve perto dos 60% em 2014, pode ser um fator chave para perceber a magnitude da mudança no Parlamento Europeu (futuramente falaremos do tema). Decisivamente, os dois maiores grupos, que representam o centro-direita e o centro-esquerda mainstream na maior parte dos Estados-membros, parecem condenados a perder (pela primeira vez desde que há eleições) a capacidade de formar maioria, naquilo que poderá ser a grande mudança estrutural das eleições de maio. Em termos nacionais, seria como se a soma dos deputados do PSD e PS fosse insuficiente para formar uma maioria absoluta.
Não obstante, o cenário mais provável é ainda o da manutenção do status quo europeísta, ainda que agora se exija a participação dos liberais, reunidos no grupo da ALDE, que se vê reforçada com os eleitos franceses do partido de Emmanuel Macron e poderá atingir os 100 eurodeputados. Este grupo de continuidade poderá revelar-se fundamental na eleição do Presidente da Comissão e na função de escudo contra os eurocéticos ou europonentes em crescimento.
Aliás, um outro cenário que tem vindo a ser estudado (e temido, em boa verdade) é o da possibilidade de uma aliança entre os grupos de extrema-esquerda e de extrema-direita, que podem alcançar um quinto dos lugares do parlamentos. Esta é uma hipótese difícil, desde logo porque os extremistas tendem a detestar outros extremistas por não serem suficientemente extremistas.
De qualquer maneira, parece evidente que os resultados das eleições europeias vão afetar dramaticamente o equilíbrio de poderes instituído e mudar a forma de fazer política em Bruxelas (e, por períodos homeopáticos, também em Estrasburgo). Não será de estranhar que o Parlamento bloqueie na proposta de um candidato à Comissão e que o processo do spitzenkandidat seja reponderado. O que não quer dizer que, no final do dia, uma coligação europeísta de solidez ageringonçada no Conselho e no Parlamento não deixe de aparecer. Recorrendo a uma citação desgastada, poderá ser preciso que tudo mude para que o projeto europeu permaneça exatamente como está.
Texto de João Diogo Barbosa, Jorge Félix Cardoso e Rui Guilherme Araújo, membros da EuroTeam Shifter
Artigo atualizado a 16/12 para inclusão da linha sobre o G/EFA, inicialmente ausente da tabela, e aproveitando também para atualizar os dados do PoP. As nossas desculpas pelo lapso.